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Saiba porque a MPV 1045 é uma armadilha para os trabalhadores

A MP, que teve seu texto base aprovado ontem pela Câmara, cria mecanismos para prejudicar os trabalhadores em uma tentativa de reeditar o Carteira Verde e Amarela; SMetal esclarece ponto a ponto

Imprensa SMetal
Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Parecer do relator, Christino Aureo, foi criticado por vários deputados. Para eles, medidas emergenciais se transformaram em alterações permanentes, reduzindo ainda mais direitos

Parecer do relator, Christino Aureo, foi criticado por vários deputados. Para eles, medidas emergenciais se transformaram em alterações permanentes, reduzindo ainda mais direitos

Por 304 a 133, com uma abstenção, a Câmara aprovou na terça-feira, 10, o texto base da Medida Provisória (MP) 1.045. A MP, redigida pelo deputado federal Christino Áureo (PP), cria mecanismos para prejudicar os trabalhadores em uma tentativa de reeditar o programa “Carteira Verde e Amarela”. Essa medida, que originalmente prevê a redução de jornada de trabalho, salário e suspensão do contrato de trabalho, sofreu diversas edições por parte do relator para tentar inserir o que muitos especialistas tem chamado de “mini-reforma trabalhista”.

Os “jabutis”, como são chamadas as emendas parlamentares que modificam os projetos de lei, estão escondidos, mas representam perdas irreparáveis para a classe trabalhadora. Na surdina, o deputado inclui temáticas que não têm nada a ver com o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm 2021), editado pela respectiva MP, para tentar aprovar o sucateamento dos direitos trabalhistas.

Entre os principais pontos estão: contratação dos trabalhadores por meio do Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore); redução do recolhimento mensal do FGTS dos novos contratos pelo Priore, de 8% sobre o salário para 2% (no caso de microempresas), 4% (empresas de pequeno porte) e 6% (demais empresas); as empresas só poderão contratar até 25% do total do seu quadro funcional; pagamento parcelado de direitos como as férias.

“Aqui o problema não é a geração de empregos, até porque ninguém é contra isso. A questão é que se gera uma ocupação pontual – que não se renova depois de alguns meses – e que não respalda o trabalhador. A permissão que se dá ao aprovar a MPV 1045 é a de sucatear os postos de trabalho. É mais do que importante esclarecer, ponto a ponto, a questão”, afirma o presidente do SMetal, Leandro Soares.

O secretário-geral do Sindicato, Silvio Ferreira, aponta ainda que o programa abre brechas para demissão. “Do jeito que está, o Priore não cria mecanismo para impedir que o empresários mandem embora quem está empregado. Isso pode ter um impacto considerável e gerar desemprego na categoria de Sorocaba e Região”.

Muitos outros pontos são problemáticos, como apontado pelo Departamento Jurídico do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal) e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

Entenda ponto a ponto o que pode estar em jogo:

O que é o Priore? Como vai funcionar a contratação através desse programa?

SMetal: Poderão ser contratados por meio do Priore trabalhadores de 18 a 29 anos e, também, acima dos 55 anos – que estejam desempregados há mais de 12 meses – recebendo um salário-base mensal de até dois salários mínimos.

Opinião Leandro Soares: “O Priore traz muitas penalidades para o trabalhador, além de afirmar a redução de jornada e suspensão de contrato por acordo individual, contrariando a Constituição, que determina esses tipos de situações devem ter acordo coletivo.

Outro ponto a se destacar é que o programa não é uma política consistente para criação de emprego e tem um viés eleitoreiro, ou seja, vai atrair pessoas desesperadas por um posto de trabalho com menos direitos. Importante enfatizar que o SMetal não é contra propostas que criem vagas no mercado de trabalho, mas cobra que não seja com menos direitos e que seja num processo contínuo”.

Quais são as condições (tanto de salário, quanto de direitos) impostas nesse tipo de contratação?

SMetal: No prazo de 36 meses a contar da vigência da lei, poderá ser realizada a contratação de trabalhadores por meio do Priore e o prazo de duração do contrato de trabalho será de até 24 meses. A alíquota mensal relativa aos depósitos para o FGTS será de 2% para microempresas, 4% para empresas de pequeno porte e 6% para as demais empresas.

Poderão ser contratados por meio do Priore trabalhadores com salário-base mensal de até dois salários mínimos. E esses trabalhadores terão direito ao recebimento do Bônus de Inclusão Produtiva (BIP), que garantirá valor equivalente ao salário mínimo hora e alcançará um quarto do número de horas de trabalho pactuadas, até o limite de R$ 275,00 por mês (considerando o valor atual do salário mínimo).

Opinião Silvio Ferreira: “O Priore, na verdade, cria subempregos. Serão trabalhadores que com menos direitos e que, ao final do contrato, deixam de ter garantias importantes, como FGTS, que será menor. A realidade é que a proposta é boa para o patrão, que vai aumentar seu lucro as custas de inúmeros brasileiros massacrados pelo desemprego e pela custo de vida que sobe a cada dia”.

Qual o impacto previsto na criação de empregos?

SMetal: De acordo com o parecer do relator deputado Christino Áureo (PP/RJ), serão quatro milhões de trabalhadores que farão parte do programa que será vigente até 2026. É importante destacar que a redação prevê que o programa valerá apenas para novos postos de trabalho. Apesar desse dispositivo, que não sabemos como será fiscalizado na prática, fica claro que o programa visa oferecer quatro milhões de trabalhadores às empresas “mais baratos” em comparação aqueles trabalhadores que já exercem suas atividades no local de trabalho.

Opinião Leandro Soares: O melhor caminho para inserir os jovens e reabrir oportunidades para os trabalhadores experientes é pelo próprio crescimento econômico. A base do SMetal pode ser utilizada como exemplo. Entre 2008 e 2014, ao menos 39,41% das contratações foram de jovens de até 24 anos de idade. A partir do momento que tivemos a crise política, causada pelo golpe de 2016 que gerou uma forte crise econômica, a porcentagem de jovens admitidos até 24 anos caiu para 27,40%.

Em outras palavras, entre 2008 e 2014, em média quinhentos jovens de até 24 anos eram admitidos todo mês, após o impeachment até os dias atuais, esse número caiu para duzentas admissões por mês.

O problema é que realmente precisamos criar oportunidades para os jovens, mas a proposta aproveita o contexto para criar uma condição precária de emprego. Outro ponto pertinente é que, quando surgem propostas dessa natureza sempre falam que irá gerar empregos, assim como foi com a reforma trabalhista de 2017 – que não entregou o que foi prometido e sim condições piores aos trabalhadores. Por isso, do ponto de vista técnico, o programa é ruim para os trabalhadores e estimula substituição a médio e longo prazo de mão de obra.

Quantos trabalhadores cada empresa poderá contratar pelo Priori?

SMetal: As empresas só poderão contratar até 25% do total do seu quadro funcional. Empresas com até 10 (dez) empregados poderão contratar 3 (três) empregados pelo programa.

As empresas podem demitir para contratar pelo Priore?

SMetal: O Projeto de Lei está para o Priore está destinado a preencher novos postos de trabalho. Contudo, a “criatividade” do empregador brasileira é tamanha que o SMetal pode enfrentar esse problema e deverá atuar imediatamente.

O contrato sob o regime do Priore terá no máximo 24 meses de duração. Se ultrapassar este período será convertido automaticamente em contrato por prazo indeterminado. Como o MPV determina prazo máximo de 24 meses para que o trabalhador esteja no Priore, se ultrapassado esse interregno, o contrato de trabalho passa a ter prazo indeterminado alterando todas as premissas da contratação, tais como salário, FGTS, INSS e tudo mais.

Opinião Silvio Ferreira: “A medida cria trabalhadores em condições diferentes, mas que estão atuando de forma semelhante. Isso é injusto. É importante lembrar também que, sem mecanismo claros de fiscalização, as empresas podem, sim, demitir para contratar outros trabalhadores pelo programa. Se por um lado o governo cria subempregos para uma parcela das pessoas, de outro abre brechas para muitos trabalhadores podem ir para o olho da rua. Isso pode ter um impacto considerável e gerar desemprego na categoria de Sorocaba e Região. Na primeira vez que tentou criar a Carteira Verde Amarela, o governo Bolsonaro abria a possibilidade para que 7 mil metalúrgicos da nossa base perdessem seus postos de trabalho

Conclusão: A conclusão que se tira disso tudo é que o governo não tem compromisso genuíno com uma política de criação de empregos. Ele cria, com finalidade eleitoreira, programas que tem data para começar e terminar. Como laboratório, se vale do desespero de uma população que vê os níveis do custo de vida e do desemprego atingirem patamares que antes nunca foram registrados. O trabalhador e a trabalhadora merecem, sim, seu posto de trabalho, mas com formalidade, direitos e benefícios assegurados. Enquanto houverem condições desfavoráveis para os metalúrgicos, o Sindicato estará lá para cobrar o que lhes cabe de direito”, finaliza Leandro Soares.

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