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Análise

Número de pessoas vivendo na miséria cresce e chega a quase 40 milhões

Indicadores econômicos e sociais mostram que o país vai mal: pelo menos 39 milhões de pessoas estão vivendo na miséria; especialistas apontam o fim do Auxílio Emergencial como agravante deste cenário

Imprensa SMetal
Fernanda Carvalho/Fotos Publicas
De acordo com dados do CadÚnico, cerca de 39,9 milhões de pessoas vivem na miséria no país

De acordo com dados do CadÚnico, cerca de 39,9 milhões de pessoas vivem na miséria no país

No dia 16 de setembro de 2014, a principal notícia no portal do governo federal era de que o país deixava o Mapa da Fome, indicador global da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). À época, o índice de prevalência de subalimentação estava abaixo de 5%. Isso representa que menos que 5% da população brasileira vivia em situação de insegurança alimentar.

Hoje, as principais manchetes no Brasil são outras. Ora demonstram que o país voltou ao Mapa da Fome, como ocorreu em 2020, ora expõem o crescente desemprego. Nesta semana, o número de cadastros no CadÚnico (Cadastro Único para programas sociais do governo federal) chegou a 14 milhões de famílias.

São cerca de 39,9 milhões de pessoas vivendo na miséria. Para se ter uma noção, o número de brasileiros que passam o mês com R$ 89 no bolso poderia lotar quinhentos Maracanãs. Os dados, divulgados pelo Ministério de Cidadania, mostram a “cruz” que os mais pobres precisarão carregar, mais uma vez, por indiferença de seus líderes.

Só em Sorocaba há 44 mil famílias inclusas no Cadastro Único, sendo que 14 mil vivem mensalmente com esses mesmos R$ 89 por pessoa. Iniciativas como o Banco de Alimentos de Sorocaba tentam, da forma que conseguem, auxiliar essas famílias, levando nutrição e segurança alimentar, mas não podem exercer o papel de estado. “O que fazemos é proporcionar um pouco de justiça social aos que mais precisam. Temos um governo omisso, que cava suas crises e faz com que o pobre ainda pague a conta”, afirma Tiago Almeida do Nascimento, presidente do Banco.

O ódio da elite aos pobres nunca foi tão escancarado

Para Victor Pagani, sociólogo e supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o país vive uma “política econômica ultraliberal”. Ele argumenta que, com medidas como as privatizações e o desmonte das políticas públicas, existe uma agenda – que vem desde o governo de Michel Temer (MDB) – para destruição do estado fazendo, assim, com que a desigualdade esteja cada vez mais acentuada.

Uma das máximas que expõem esse cenário de abismo social é o fim do Auxílio Emergencial em 2020. Para começar, essa política de renda, que foi defendida por movimentos sociais, sindicais e partidos de oposição, teve o presidente como um dos principais políticos desfavoráveis ao programa.

Em um cenário econômico, sem o auxílio, os especialistas estimam que o país fecharia 2020 com queda de 10% no Produto Interno Bruto (PIB), como explica Imira Rando, mestre em economia. “As projeções de queda do PIB para 2020 falam em uma redução de 5%. Os dados ainda não foram fechados, mas alguns economistas acreditam que essa queda poderia ter sido próxima de 10% se não fosse o Auxílio Emergencial. Não só essa política de transferência de renda foi fundamental para a economia no período, a expansão do crédito também possibilitou maior consumo das famílias”.

Segundo o último Boletim Dataprev, foram 68,2 milhões de beneficiados ao longo do programa que se tornou vital para que famílias pudessem se alimentar, vestir e pagar os custos da vida – que anda cara. Ainda assim, apoiadores que se espelham no presidente destilam ódio pelos mais pobres se colocando como contrários ao Auxílio Emergencial. “Bolsonaro e seus apoiadores reproduzem a ideologia que busca naturalizar as desigualdades, a exclusão, a violência e, assim, a própria barbárie”, completa o sociólogo Victor Pagani.

Na contramão dos avanços e melhorias

Na estrada, o Brasil faz caminho reverso. “Enquanto as nações vacinam sua população, o país sucumbe cada vez mais ao avanço da pandemia da Covid-19, sem apresentar um plano de vacinação concreto”, comenta o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal), Leandro Soares. Além disso, estima-se que sem vacina e medidas para recuperar a economia demissões vão crescer.

Na visão da economista Imira Rando, alguns erros da equipe econômica do governo federal têm sido cruciais para que não existam avanços e o país só “ande para trás”. Ela destaca, por exemplo, a falta de diplomacia, que afasta investidores estrangeiros e reduz a confiança de agentes internos, e a inexistente política para estímulo de emprego, renda ou expansão de políticas sociais de permanência.

“O Sindicato dos Metalúrgicos promoveu acordos e negociações para proteger a saúde, o emprego e a renda da categoria. O que vemos no cenário brasileiro é que o governo, em si, não tem nenhum interesse em fazer o mesmo pelos trabalhadores, metalúrgicos ou não”, pondera Antonio Welber Filho, o Bizu, diretor executivo do SMetal.

O que acrescentam os especialistas?

Victor Pagani, sociólogo e supervisor técnico do Dieese

“Houve uma série de medidas como a terceirização sem restrições, a Reformas Trabalhista e Previdenciária. Todas no sentido de retirar direitos trabalhistas, dificultar a aposentadoria, restringir a organização sindical, precarizando ainda mais as relações e condições de trabalho. Somadas à essas medidas, Bolsonaro e Guedes tentam aprovar uma série de Propostas de Emenda à Constituição (PECs), entre as quais a chamada ‘Reforma Administrativa’, cujo intuito é transformar nossos direitos sociais contratados na Constituição de 1988 em mercadorias que serão acessíveis apenas para quem puder pagar.”

Imira Rando, mestre em economia pela Unesp

“O que se discute em outros países, e deveríamos analisar por aqui, é que a recuperação da economia no pós-pandemia poderá se dar de forma diferente entre a camada mais rica e mais pobre da população. Estima-se uma recuperação mais rápida das pessoas com maiores rendas e uma recuperação lenta ou até mesmo queda na renda dos mais pobres. A pandemia agrava a desigualdade, portanto, sairemos dela mais vulneráveis.”

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