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Suspeita de Cartel

Empresa contesta licitação da merenda escolar em Sorocaba

A empresa Apetece ingressou com um recurso administrativo contra a licitação para o fornecimento de merenda escolar sob a suspeita de um possível cartel envolvendo contratos de mais de R$ 40 milhões

Jornal Cruzeiro do Sul
Divulgação

A empresa Apetece Sistemas de Alimentação SA ingressou com um recurso administrativo contra a licitação para o fornecimento de merenda escolar sob a suspeita de um possível cartel envolvendo contratos que totalizam mais de R$ 40 milhões. A empresa fornece atualmente o serviço sob contrato emergencial com a Prefeitura de Sorocaba e pede à Comissão Permanente de Licitação (CPL) que o processo seja anulado.

As vencedoras da concorrência foram as empresas Pack Food Comércio de Alimentos Ltda, para os lotes 1 (R$ 13,8 milhões) e 3 (R$ 14,5 milhões), e Aex Alimenta Com. de Ref. e Serv. Ltda., que ficou com o lote 2 (R$ 14,4 milhões). As duas empresas negam a existência de um cartel e afirmam que a Apetece teria o objetivo de atrapalhar o processo, por ser a atual prestadora do serviço.

O pregão presencial foi realizado em dezembro de 2016 durante o governo do ex-prefeito Antônio Carlos Pannunzio (PSDB). E de acordo com a administração atual da Prefeitura, dirigida pelo prefeito José Crespo (DEM), o objetivo é analisar os recursos o mais rápido possível para garantir a normalidade da merenda até o início das aulas. O contrato com a Apetece termina neste mês e as aulas terão início em fevereiro.

Diferenças de valores

Segundo o recurso apresentado pela Apetece em 3 de janeiro de 2017, chama a atenção o fato de que um mesmo grupo de empresas apresentam propostas com valores que seriam “ínfimos”, enquanto as demais licitantes fizeram propostas executáveis. As diferenças entre os valores chegariam a R$ 5 milhões.

De acordo com a Apetece, os valores apresentados pelas empresas são até 54% inferiores ao orçado pela Prefeitura. Para a empresa, essas ofertas contrariam o art. 48 da Lei 8.666/93, que estabelece em até 70% dos valores orçados pela administração o patamar mínimo para que as propostas sejam consideradas exequíveis (ou seja, que tem condições de execução).

O recurso destaca ainda que algumas das empresas cujas propostas seriam inexequíveis não apresentaram recursos e não assinaram a ata do pregão, apenas subscrevendo por declaração, o que seria incomum. A empresa Menezes, por exemplo, vencedora do pregão inicialmente foi inabilitada por conta do não atendimento de requisitos e, ainda assim, não entrou com recurso. O documento da Apetece ressalta que a empresa tem sede em Sergipe e, mesmo vindo de tão longe, não demonstrou interesse em reverter a decisão que impedia a assinatura de um contrato de quase R$ 12 milhões.

O recurso da Apetece sugere que as oitos empresas com preços inexequíveis (Pack Food, Aex Alimenta, F.G.R. Silva, Nutrivida, Soluções, Le Garçon, Aparecida Regina Cassarotti e Menezes Serv.) estavam ali para criar uma “parede” aos demais licitantes com propostas de preço válidas, de modo a restringir a competitividade do certame.

O recurso argumenta que “a olho nu, denota-se possível intenção de restrição a competitividade da licitação por meio de possível cartel de empresas”. A empresa lista que o vencimento de propostas com valores inexequíveis pode acarretar em baixíssima qualidade do serviço, além de pedidos intempestivos de reequilíbrio econômico e financeiro do contrato.

Sessão fechada

A empresa PR Alimentos Preparados Ltda., também participante da licitação (e não citada no possível cartel), apresentou outro recurso pedindo a nulidade da licitação. A empresa alega que, após a sessão presencial realizada em 28 de dezembro, a Apetece teve um encontro à portas fechadas com a administração.

A PR cita que uma ata adicional da reunião foi publicada no site da Prefeitura de Sorocaba, em que consta um recurso da Apetece e apenas a assinatura da mesma. Para a PR, essa sessão somente com a Apetece contraria o princípio de publicidade dos atos administrativos. A empresa cita ainda para a nulidade do processo as propostas inexequíveis.

Soluções

A empresa Soluções apresentou contrarrazão ao recurso da Apetec classificando as alegações da empresa como difamatórias. O documento diz que responsabilizará a denunciante nas esferas administrativas, cíveis e criminais, pedindo ao município que abra procedimento para investigar a Apetece, inclusive por ter sido contratada em duas ocasiões de forma emergencial, sem licitação.

A Soluções nega qualquer combinação, acerto ou cartel e destaca que entrar com recurso é um direito e não uma obrigação. A empresa também pede a anulação da sessão pública por causa do encontro “à portas fechadas”.

Pack Food

A vencedora dos lotes 1 e 3, Pack Food alega, em sua contrarrazão, que a Apetece tenta macular ilegalmente o processo licitatório porque não conseguiu vencê-lo. A empresa cita ainda que o art. 48 da Lei 8.666/93 refere-se a serviços de engenharia e de obras e que não pode ser aplicado literalmente.

Assim, reafirma que o valor proposto para os serviços é exequível e cita como exemplo contratos semelhantes que já firmou com os municípios de Tietê, Votorantim e São Sebastião.

AEX

A vencedora do lote 1, AEX, também argumentou em sua contrarrazão que a legislação se refere a obras e que não deve ser interpretada literalmente. A empresa ainda anexou documentos que comprovariam a capacidade de executar a proposta, como planilhas, cardápios e orçamentos de contratos firmados anteriormente com outras cidades. Segundo a argumentação da AEX, a Apetece tenta manter os preços atualmente praticados a todo custo, com o objetivo de prorrogar a atual contratação.

A AEX argumenta ainda que a acusação de cartel é ilógica, visto que a prática ilegal tem o objetivo de aumentar os preços dos produtos, obtendo maiores lucros e não diminuir os preços e beneficiar o consumidor ou contratante.

Tentativa de impugnação

Em 21 de dezembro, um pedido de impugnação do pregão foi feito ao Tribunal de Contas do Estado (TCE). O autor Denilson Leite Barbosa apontava problemas com os requisitos técnicos do edital, alguns deles que considerava restringir desnecessariamente a ampla participação de empresas no certame. Com o recesso do Fórum, porém, o pregão ocorreu antes da análise do pedido, que foi publicada em 12 de janeiro. O TCE afirmou, contudo, que as questões citadas no processo serão objeto de atenção quando ocorrer a contratação.

Concorrente diz ter feito proposta com preço já praticado

As outras empresas citadas pelo recurso da Apetece, no susposto cartel, não apresentaram contrarrazões, mas foram procuradas pela reportagem. A empresa Le Garçon afirmou, por meio da funcionária Melissa Maciel — que representou a empresa na sessão pública — que fez uma proposta dentro dos preços praticados pela empresa em outras cidades e que desconhece a existência de um cartel. A empresa Aparecida Regina Cassarotti preferiu não se manifestar.

A empresa Menezes afirmou que concorreu para ganhar ao menos um lote, porque tem estrutura para operar com o preço proposto. No entanto, houve um equívoco na interpretação do índice que não atendeu às exigências do edital, sendo desclassificada. Logo, nos demais lotes as propostas da empresa nem foram consideradas. Quanto ao recurso, o jurídico teria entendido não ter condições de reverter o resultado do certame.

A empresa F.G.R Silva foi contatada na tarde de terça-feira, mas não apresentou representante que pudesse falar sobre o assunto até a finalização desta reportagem. A reportagem não conseguiu contato com a Nutrivida.

Secretaria de Licitações tem 5 dias para analisar recursos

A Secretaria de Licitações e Contratos informou que tem um prazo administrativo de cinco dias para analisar os dois recursos apresentados, mas que há um empenho do secretário Alexandre Robim para que a avaliação ocorra o mais rapidamente possível. A precocupação seria “o caráter de urgência para garantia da normalidade dos serviços licitados até o início das aulas”. Após a análise haverá outros prazos legais a serem cumpridos para contestação. A secretaria disse ainda que desconhece que tal reunião a portas fechadas tenha ocorrido.

O último contrato celebrado para atender a merenda escolar em Sorocaba data de 27 de junho de 2016, com duração de 180 dias ao custo de R$ 33,6 milhões.

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