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Integração regional

Dirigentes do SMetal participam de evento que discute união da América Latina

O encontro reuniu mais de 4 mil representantes de movimentos sociais e sindicais, de 26 países

Gabriela Guedes/Imprensa SMetal
Rodrigo Remédios/UNILA

Leia abaixo a Carta elaborada durante o encontro.

*Com informações do Brasil de Fato

Diretores do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal) participaram, entre os dias 22 e 23 de fevereiro, da Jornada Latino-Americana e Caribenha de Integração dos Povos, em Foz do Iguaçu, onde fica a Tríplice Fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai. 

O encontro, que tinha como objetivo promover a integração entre os povos da América Latina e Caribe, além de traçar estratégias comuns para combater a extrema direita e o avanço do imperialismo, reuniu mais de 4 mil pessoas de 26 países ligadas a movimentos sociais, sindicatos, movimentos feministas e de luta pela igualdade racial e de gênero. Confira abaixo a carta lançada ao final do evento, na íntegra.

O evento foi organizado pela ALBA Movimientos, a Assembleia Internacional dos Povos (AIP), a Confederação Sindical das Américas (CSA), a Organização Continental Latino-americana e Caribenha de Estudantes (Oclae), a Jornada Continental pela Democracia e Contra o Neoliberalismo, bem como as universidades Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) e a Federal da Integração Latino-Americana (UNILA).

O vice-presidente do SMetal, que participou do evento, Valdeci Henrique da Silva (Verdinho), conta que o evento discutiu a importância da democracia na região, que foi uma conquista dos povos latino-americanos. 

“Ouvimos muitas histórias assustadoras de ataque às instituições democráticas. É um grande desafio para o campo progressista se envolver mais nas pautas sociais emergentes, como o combate à fome e o desemprego, que avançam no capitalismo”, afirma o dirigente.

Para ele, há dificuldades diferentes, “mas contrapor o neoliberalismo é uma pauta comum. Além disso, discutimos como a extrema direita se apropria da sensação de falta de tudo que promove o bem-estar social, resultado do neoliberalismo”.

Além do ex-presidente uruguaio Pepe Mujica, participaram da Jornada a vice-presidenta da Colômbia, Francia Márquez; o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macedo; a deputada federal e presidenta do PT, Gleisi Hoffmann; o Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Sílvio Almeida; e a ministra da Secretaria da Presidência da Bolívia, Marianela Prada.

União dos povos

Na abertura do evento, Bernadete Esperança, da Marcha Mundial das Mulheres (MMM) destaca que, para além da fome, avanço das guerras e do extermínio físico dos seres humanos são sintomas do agravamento da crise mundial.

“A unidade é urgente e necessária. Nós só vamos derrotar o imperialismo se conseguirmos construir essa perspectiva de unidade. E unidade não pode ser só em evento, precisamos construir uma agenda de lutas e de mobilizações que nos coloque numa ação constante para derrotarmos o imperialismo”, completou a militante feminista. 

Já a vice-presidenta da Colômbia, Francia Marquez, primeira mulher negra a ocupar o cargo, defendeu em Foz do Iguaçu (PR) a superação de práticas machistas e racistas na esquerda, que, segundo ela, prejudicam a união dos povos na América Latina. 

“Um dos grandes erros que cometemos como região é que a esquerda latino-americana foi tolerante com culturas machistas e racistas. Nossa união regional deve surgir das entranhas dos povos, em sintonia com a base e dos movimentos sociais”, afirmou, sob aplausos de uma multidão.

Outro tema abordado durante o evento foi a guerra contra a Palestina. O jornalista e fundador do portal Ópera Mundi, Breno Altman, fez o lançamento de seu novo livro “Contra o Sionismo: retrato de uma doutrina colonial e racista”, publicado pela Editora Alameda. Altman afirmou que o assassinato de 6 milhões de judeus durante o holocausto é a fonte de legitimidade do regime sionista. 

“Hoje aplicam contra outro povo as mesmas ferramentas de extermínio utilizadas contra o povo judeu”, destacando que o sionismo não é uma expressão do judaísmo e jamais foi inimigo do nazismo. 

“O sionismo não tem a ver com o povo judeu, tem a ver com a burguesia judaica e o imperialismo. Ao apontar o dedo, ao expor essa ferida, Lula contribui e muito com a solidariedade internacional. Acabaram-se as meias-palavras, as vísceras do sionismo estão expostas”. 

O encerramento do evento ficou com o ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica. “Se não temos os povos, não vamos conseguir [a integração]. Os governos mudarão, mas os povos pressionarão. A história não é feita por grandes caudilhos, a história é feita pelas massas”, disse o uruguaio, que dividiu o ato de encerramento com a vice-presidenta da Colômbia, Francia Márquez, a presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, e o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macêdo.

Confira a carta na íntegra:

Foz do Iguaçu, 23 de fevereiro de 2023 

Jornada Latino-americana e Caribenha de Integração dos Povos 

Carta aos povos pela integração da América Latina e do Caribe 

Nós, os povos do mundo, estamos passando por uma crise estrutural global do sistema capitalista, cujos resultados são imprevisíveis. Esse é um produto do próprio desdobramento do capitalismo em sua fase neoliberal, que ameaça os diferentes aspectos da sustentabilidade da vida. Como povos, estamos sofrendo uma crise sistêmica que se manifesta nas crises alimentar, ambiental, social e econômica sem precedentes na história da humanidade. A precariedade de nossos empregos e a falta de acesso aos direitos básicos para uma vida digna colocaram centenas de milhões de pessoas em uma situação de “sobrevivência” diária em que a migração se torna uma necessidade angustiante para milhões. Em nossos territórios, sofremos as consequências dos crimes ambientais produzidos pelas corporações transnacionais em um contexto de crise dos Estados nacionais, onde o capital financeiro internacional se impõe. Estamos passando por uma profunda crise de valores em que nossas sociedades e povos são cada vez mais guiados por aspirações individualistas e consumistas. 

A crescente disputa geopolítica reforçou a face mais bélica do imperialismo estadunidense e de seus aliados da OTAN, colocando-nos cada vez mais em risco de um conflito armado sem precedentes. A guerra na Ucrânia é uma consequência disso, assim como o genocídio que está sendo cometido pelo Estado de Israel contra o Povo Palestino. 

A partir da Jornada Latino-americana e Caribenha de Integração dos Povos, reafirmamos nossa solidariedade internacionalista e a defesa da causa palestina. A comunidade internacional deve atender ao apelo dos povos por um cessar-fogo imediato e pela criação de um Estado palestino soberano e livre. 

Expressamos nosso total apoio e solidariedade ao presidente Lula na denúncia do genocídio na Palestina. Se Lula é persona non grata, o povo latino-americano é persona non grata para Israel. 

Viva o povoo palestino! Viva o presidente Lula! 

Os povos da “Nuestra América” (Nossa América) tiveram de viver em permanente resistência às estratégias imperialistas de dominação reorganizadas pelo grande capital. Nesse caminho de resistência, nossos povos e suas organizações puderam dar passos fundamentais para avançar em nosso projeto histórico de integração de nossos povos. Somos filhos e filhas da resistência ao colonialismo racista, aos processos de ditaduras militares em nossa região, filhos e filhas da resistência popular e das rebeliões contra a onda neoliberal do final do século passado. Filhos e filhas da construção do “Não à ALCA”. Crescemos sob o farol e a resistência heróica da revolução cubana e estávamos em Mar del Plata gritando “ALCA, ALCA carajo!”, junto com o Comandante Chávez. 

Hoje nos reunimos novamente porque o desafio da unidade de nossos povos e de suas organizações é fundamental para deter uma extrema-direita que quer destruir nossas soberanias nacionais e populares para colocar nossos países a serviço do capital financeiro internacional e de suas corporações transnacionais. Também nos unimos para construir NOSSO projeto de integração soberana baseado na solidariedade e na complementaridade entre nossos povos.

A solidariedade é um pilar fundamental de nossa integração, por isso devemos reafirmar nossa solidariedade com Cuba, Venezuela e suas revoluções como bandeiras fundamentais de nosso processo. Reafirmamos nosso compromisso de continuar trabalhando na campanha internacional “Cuba Vive e Resiste!” para retirar a ilha da lista de países que patrocinam o terrorismo, assim como continuaremos denunciando o bloqueio genocida imposto ao povo cubano há mais de 60 anos. Denunciamos que o imperialismo está reorganizando uma campanha para deslegitimar o processo democrático que está sendo construído pelo povo venezuelano e sua revolução bolivariana e nos comprometemos a fortalecer nossa solidariedade denunciando as medidas coercitivas unilaterais impostas a esse país pelos Estados Unidos. 

Viva a Revolução Cubana! Viva a Revolução Bolivariana! 

O fortalecimento da solidariedade com o Haiti é uma tarefa permanente. Condenamos a perversa e criminosa dominação neocolonial no Haiti e nos comprometemos a desenvolver uma solidariedade plena e ativa com o povo e os movimentos populares haitianos. Endossamos sua oposição a uma intervenção militar controlada pelos Estados Unidos e inserida na agenda de dominação imperial da região do Caribe. Exigimos reparação pelos crimes cometidos contra o povo haitiano por sucessivas forças de paz da ONU, como a MINUSTAH, que agravaram a crise estrutural daquela sociedade e vergonhosamente se aliaram a forças de extrema direita totalmente submetidas à vontade dos Estados Unidos. Até hoje, o povo haitiano continua resistindo heroicamente às investidas do imperialismo por ter feito a primeira revolução em nossa região, abrindo os caminhos revolucionários em nosso continente. 

Viva o povo haitiano! 

Apoiamos e defendemos a autonomia dos povos indígenas das Américas, suas culturas e seus modos de vida. Instamos os governos a devolver os territórios de ocupação tradicional dos povos, bem como a Itaipu Binacional a implementar um programa de reparação aos Avá Guarani de ambos os lados da barragem (Brasil e Paraguai), pelas violações de direitos cometidas desde sua construção na década de 1970. 

Nossa integração regional deve assumir a descolonização do poder e da cultura e construir um contrapoder de baixo para cima, a partir dos povos e territórios, com base no respeito aos processos históricos, à memória, à ancestralidade, aos corpos diversos e rebeldes. Devemos construir e posicionar uma narrativa contra-hegemônica baseada na reciprocidade, na complementaridade, na coletividade e na consciência de sermos natureza. 

Nós, os movimentos populares e as organizações sindicais, viemos trabalhando e exigindo que a integração regional responda às necessidades concretas da população e também leve em conta a ideia de que não será possível superar as limitações econômicas e sociais dos países de forma isolada. Essas premissas estão associadas à geração de condições de vida e trabalho para toda a população e que essa deve ser uma condição estrutural do modelo de desenvolvimento sustentável. Uma integração que recupera o trabalho e o emprego como fatos econômicos que estão na base da produção e reprodução da vida, da criação de riqueza e bem-estar, onde o “que” e “como” produzir estão no centro, onde as mulheres são respeitadas como protagonistas da economia e portadoras de direitos. 

Nossa integração regional deve assumir o direito dos povos de definir suas próprias estratégias políticas e sistemas agroecológicos e justos de produção, distribuição e consumo de alimentos, com base na produção camponesa e em pequena escala, reconhecendo o papel central das mulheres. Esse é um pilar fundamental na luta contra as crises climática, de biodiversidade, hídrica e alimentar. A integração regional também deve responder à construção coletiva de uma transição justa, popular e feminista. Essa é uma aposta essencial na disputa de transições urgentes e necessárias para o processo de transformação das sociedades e a construção de um projeto político popular emancipatório. 

Uma característica estrutural de nosso projeto é a integração de uma perspectiva feminista e diversa que reconhece e reafirma o papel central das mulheres como sujeitos políticos. Ele também exige a realização do direito das mulheres ao território, à terra e aos meios de produção para garantir sua autonomia econômica, seus corpos e suas vidas. Outro elemento fundamental é a remuneração justa por seu trabalho e o desenvolvimento de sistemas diversificados e justos de produção, distribuição e consumo de bens. 

Um projeto de integração deve defender que todas as pessoas têm o direito de migrar ou não migrar e de retornar aos seus países de origem. A migração é um fenômeno econômico, social, cultural e político que faz parte dos processos de formação de sociedades e nações. É necessário erradicar a criminalização da migração e incentivar os migrantes a se integrarem econômica, social, cultural e politicamente em seus países de acolhimento. Rejeitamos a xenofobia e os discursos de ódio contra migrantes, refugiados e solicitantes de asilo. 

Estamos vivendo um momento histórico em nosso continente e no mundo. Hoje, reunidos aqui, milhares de companheiros de movimentos populares e organizações sindicais da região, reafirmamos que estamos vivendo um momento histórico:

Nosso compromisso de trabalho e luta para promover nossos sonhos e esperanças de um continente unido, defendendo e construindo territórios soberanos e livres onde nós, os trabalhadores e trabalhadoras, possamos viver felizes e com dignidade. 

Continuaremos a nos mobilizar em todo o continente em defesa de nossos direitos e pela justiça ambiental, social, econômica e de gênero ao longo do ano: dias 2 e 8 de março, 17 de abril, 1º de maio, 5 de junho e 16 de outubro são algumas das datas em que tomaremos as ruas em unidade. 

Convocarmos e reunirmos novamente todas as nossas organizações e povos para realizar uma grande Cúpula dos Povos no âmbito da COP 30 no próximo ano, em Belém do Pará, Brasil. 

Companheiros e companheiras, hoje saímos fortalecidos dessa Jornada, nossas esperanças se levantam, porque, se nosso caminho é de luta e unidade, nosso horizonte é de vitória. É o de um continente livre, justo e soberano. 

Viva a integração dos nossos povos! 

Viva a América Latina e o Caribe unidos! 

Viveremos e venceremos! 

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