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Constituição

Conhecimento qualificado é a base da democracia

A Constituição brasileira completou 27 anos em outubro de 2015. Ela é considerada uma das Cartas de Leis mais avançadas do mundo por transformar direitos sociais em direitos fundamentais de cidadania

Paulo Andrade e Daniela Gaspari/Revista Ponto de Fusão
Divulgação

. A Constituição pode ser baixada gratuitamente na maioria dos sites oficiais (Planalto, Senado, Câmara Federal, Tribunais)

A Constituição brasileira completou 27 anos em outubro de 2015. Ela é considerada por juristas uma das Cartas de Leis mais avançadas do mundo por transformar direitos sociais em direitos fundamentais de cidadania. E essa é a base da liberdade de participação popular no Brasil e das garantias à mulher, à criança, ao idoso, entre outros segmentos sociais. No entanto – e apesar de sua importância fundamental no cotidiano das pessoas – a Constituição é mais comentada do que lida pela maioria dos cidadãos.

Em resposta a uma pesquisa realizada pelo DataSenado no final de 2013, apenas 5,3% dos brasileiros declararam conhecer bem o texto constitucional. Outros 35,1% dos entrevistados afirmaram ter um leve conhecimento da Carta Magna. Quase 8% disseram não ter conhecimento nenhum da principal Lei do País.

Sem ter feito pelo menos uma leitura atenta da Constituição, fica ainda mais difícil o brasileiro ter noção da competência de cada Poder constituído (Executivo, Legislativo, Judiciário) e da responsabilidade de cada instância (municipal, estadual/regional e federal). O resultado é o desconhecimento de como reivindicar seus direitos e a quem criticar e cobrar quando for necessário.

Para alguns advogados constitucionalistas, o ensino da Carta deveria fazer parte da grade curricular das escolas no Brasil.

“A confusão em torno das competências de cada Poder constituído, no Brasil, acontece principalmente por falta de informação. A nossa política educacional não prevê um trabalho com mais afinco sobre essas questões. Entre os cidadãos não ligados diretamente ao Direito, só adquire esse conhecimento quem procura o estudo extra-curricular”, afirma o advogado sorocabano Claudinei Marchioli, pós-graduado em Direito Constitucional.

João Trindade, consultor na área de Direito Constitucional em Brasília, confirmou a crítica do colega sorocabano em entrevista à imprensa do Senado. Para ele, a Constituição deveria ser matéria obrigatória nos anos finais do ensino fundamental e durante todo o ensino médio.

Embora exista hoje diretrizes pedagógicas que estimulem aulas sobre cidadania, segundo Trindade, os conhecimentos abordados são quase sempre superficiais e não são vinculados diretamente à Constituição.

Mídias superficiais

Os meios de comunicação, que deveriam colaborar para a formação da cidadania consciente, não o fazem por motivos que não conseguem explicar claramente. Na opinião de Claudinei, “os jornais de rádio ou televisão costumam ser superficiais sobre o assunto. Só mostram o que interessa para eles e da maneira que interessa para eles. Não são didáticos, não querem ensinar. As vezes confundem mais do que esclarecem”, afirma.

O advogado lembra que as rádios e as TVs deveriam se esforçar ainda mais do que outras mídias para popularizar a Constituição, pois esses veículos são concessões públicas.

Mas não dá também para jogar a culpa só em terceiros, seja no sistema educacional, na imprensa ou nos políticos, o cidadão também tem que ter iniciativa, ler a Carta, exigir os direitos nela contidos para qualificar e direcionar suas críticas.

Quem quer desmotivar a leitura da Constituição brasileira reclama que ela é extensa e contém muitos termos técnicos ou jurídicos. Mas essas críticas são questionáveis.

Não é difícil de ler

Claudinei refuta essas supostas dificuldades e explica porque nossa Constituição tem 250 artigos e muitas dezenas de incisos. “O Brasil tem uma ótima Constituição, promulgada em 1988. Mas como nós estávamos saindo de um Estado totalitário na época; estávamos migrando de uma ditadura para um Estado de Direito, uma democracia ainda entre aspas na época, acabou-se por incluir na Constituição matérias que poderiam estar em leis infraconstitucionais (leis penais, civis, trabalhistas, do consumidor, etc).

Para ele, como os legisladores [da Assembleia Nacional Constituinte] ainda temiam a volta do totalitarismo e sabiam que a lei infraconstitucional poderia ser mais facilmente desrespeitada diante de uma nova ameaça autoritária. Por isso incluíram o maior número possível de assuntos na Constituição. “Foi para dar mais segurança aos direitos de cidadania”, explica o advogado.

Sendo assim, não é justo comparar a Carta Magna brasileira com a enxuta Constituição dos Estados Unidos da América (EUA) ou de países europeus com longa tradição democrática. A democracia brasileira ainda é nova, do ponto de vista histórico, e até hoje existem grupos no País que defendem intervenções militares no governo.

“Por causa dessa diferença, todos os direitos de cidadania têm que estar escritos em detalhes no papel. Nos EUA, muitos direitos já estão consolidados na cultura do povo. Não há histórico de contestação do Estado Democrático de Direito”, esclarece Claudinei.

A primeira e única Constituição dos EUA foi elaborada em 1787 e desde então sofreu apenas 27 emendas ao texto original. O Brasil já teve sete Constituições desde sua independência, em 1822, sem contar as Cartas provisórias impostas por períodos ditatoriais. Somente a Constituição atual, de 1988, sofreu mais de 80 emendas.

Em relação aos termos técnicos, que seriam outro obstáculo para a leitura, o advogado expõe o seguinte argumento em defesa da Carta: “A Bíblia também tem palavras difíceis, mas isso não é obstáculo para quem se interessa em ler o Livro. O cidadão comum lê a Bíblia e a entende. Com a Constituição é a mesma coisa. Ela é bastante compreensível para quem se interessa de fato em ler a Lei máxima do nosso País”.

Atualmente, a pessoa pode aprender o significado de qualquer palavra com uma rápida consulta em ferramentas de pesquisa na internet, como o Google.

Exemplo atual

“O conhecimento da Constituição pode evitar que a opinião pública seja manipulada por interesses suspeitos da mídia burguesa e de grupos econômicos. Um exemplo local: tem oportunistas aproveitando o bombardeio contra o governo federal para promover o desmonte do ensino fundamental e médio públicos, que são de responsabilidade constitucional do governo estadual e do município”, alerta o presidente do SMetal, Ademilson Terto da Silva.

Para baixar ou comprar a Constituição

Para quem não trabalha diretamente com legislação, não há necessidade de decorar a Constituição. Mas uma leitura atenta da Carta proporciona ao cidadão mais clareza sobre seus direitos e sobre as competências de cada órgão e instância de Poder.

É útil, inclusive, ter um exemplar em casa. A Constituição pode ser baixada gratuitamente na maioria dos sites oficiais (Planalto, Senado, Câmara Federal, Tribunais). Nas livrarias on line o exemplar impresso simples, sem comentários de juristas, custa em torno de R$ 20. Nas livrarias físicas é mais difícil de encontrar, mas sob encomenda sai, em média, por R$ 30.

Conhecimento qualificado é a base da democracia

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