O governo federal confirmou nesta terça, dia 18, acordo para votar apenas na próxima semana o Projeto de Lei 2.126, de 2011, que cria o Marco Civil da Internet. Se na véspera os ministros encarregados da negociação imaginavam ser difícil uma costura que pudesse levar à votação na Câmara, a terça-feira começou com expectativa de que amanhã a proposta fosse apreciada em plenário.
Mas, após mais uma série de reuniões, decidiu-se debater nesta quarta-feira o conceito de neutralidade de rede para na outra semana partir para o tudo ou nada em um projeto prioritário para Dilma Rousseff, que espera com isso dar uma resposta simbólica às denúncias de espionagem promovidas pelos Estados Unidos e apresentar a iniciativa na conferência global que São Paulo irá sediar no próximo mês justamente para discutir a liberdade no mundo virtual.
O dia foi fechado com uma reunião entre os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e a quarta-feira será aberta com mais uma rodada de negociação. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), disse que a reunião será um “tira-teima”. “Ou todos nós concordamos com uma proposta, ou vamos para a disputa nos itens em que não for possível chegar a um acordo”, explicou o presidente. Alves informou que o projeto terá a fase de discussão encerrada amanhã e será colocado em votação na terça-feira que vem (25). “Ele será votado irreversivelmente na terça”, avisou.
O relator do projeto, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), admitiu que pode haver mudança na regra sobre os data centers a pedido de partidos da base. “Esse ponto foi incluído após o escândalo de espionagem; não constava do projeto original, e alguns partidos da base sugerem que se busque uma redação alternativa”, disse Molon. Até agora, segundo ele, não houve mudanças no relatório apresentado no mês passado.
A oposição já avisou que é contra obrigar empresas a armazenar dados no Brasil. Os líderes do Solidariedade, deputado Fernando Francischini (PR), e do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), disseram que a medida vai encarecer o acesso à internet. “As empresas terão de replicar no Brasil a sua estrutura de data centers, e esse custo fatalmente será repassado para o consumidor”, disse Mendonça Filho.
O ponto mais polêmico da proposta, no entanto, continua sendo a neutralidade. O princípio proíbe a venda de pacotes diferenciados por serviços pelos provedores de acesso ou o bloqueio de alguns sites ou aplicativos pelas empresas que gerenciam conteúdo. Todos os usuários deverão ter tratamento igual pelas empresas.
O PMDB, no entanto, quer autorizar a venda de pacotes diferenciados de acesso a internet, posição defendida também pelas empresas de telecomunicações. Desde o começo do debate o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), se opõe à ideia do governo. Nas últimas semanas ele veio se valendo da rebelião que produziu dentro da base aliada para adiar a votação do texto, e apresentou uma alternativa que espera ver aprovada em plenário.
Enquanto isso a oposição quer tirar do governo o poder de regulamentar as exceções à neutralidade. Para a oposição, dar ao governo o poder de regulamentar a neutralidade vai permitir que algumas empresas sejam beneficiadas em detrimento de outras. O líder do DEM, deputado Mendonça Filho, apresentou hoje uma emenda que proíbe qualquer regulamentação da neutralidade. “Essa proposta do governo é neutralidade fake [falsa] porque depende de decreto do Executivo”, denunciou. “A neutralidade deve ser independente da posição política de quem governa”, disse o líder do SDD, deputado Fernando Francischini.
Molon rebateu as críticas, e os ministros dizem que essa é uma questão inegociável. “Não há como tirar a regulamentação, que é prerrogativa constitucional. Tirar isso é deixar ao sabor dos provedores quais os requisitos que eles vão usar na sua rede, ou seja, acabar com a neutralidade”, disse.
A bancada do PMDB deve se reunir amanhã para decidir a sua posição quanto ao marco civil. Até a semana passada, o líder do PMDB, deputado Eduardo Cunha (RJ), dizia que o partido iria rejeitar o texto, mas Cunha admitiu que a posição do PMDB pode mudar se o projeto for alterado nos dois pontos polêmicos.
“Estão falando em tirar os data centers, o que a gente não concorda; também falam em tirar a regulamentação por decreto, e nós não queremos interferência do governo na internet. Se essas coisas forem resolvidas, o projeto passa a ter uma chance”, disse.