Por 304 a 133, com uma abstenção, a Câmara aprovou na terça-feira, 10, o texto base da Medida Provisória (MP) 1.045. A MP, redigida pelo deputado federal Christino Áureo (PP), cria mecanismos para prejudicar os trabalhadores em uma tentativa de reeditar o programa “Carteira Verde e Amarela”. Essa medida, que originalmente prevê a redução de jornada de trabalho, salário e suspensão do contrato de trabalho, sofreu diversas edições por parte do relator para tentar inserir o que muitos especialistas tem chamado de “mini-reforma trabalhista”.
Os “jabutis”, como são chamadas as emendas parlamentares que modificam os projetos de lei, estão escondidos, mas representam perdas irreparáveis para a classe trabalhadora. Na surdina, o deputado inclui temáticas que não têm nada a ver com o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm 2021), editado pela respectiva MP, para tentar aprovar o sucateamento dos direitos trabalhistas.
Entre os principais pontos estão: contratação dos trabalhadores por meio do Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore); redução do recolhimento mensal do FGTS dos novos contratos pelo Priore, de 8% sobre o salário para 2% (no caso de microempresas), 4% (empresas de pequeno porte) e 6% (demais empresas); as empresas só poderão contratar até 25% do total do seu quadro funcional; pagamento parcelado de direitos como as férias.
“Aqui o problema não é a geração de empregos, até porque ninguém é contra isso. A questão é que se gera uma ocupação pontual – que não se renova depois de alguns meses – e que não respalda o trabalhador. A permissão que se dá ao aprovar a MPV 1045 é a de sucatear os postos de trabalho. É mais do que importante esclarecer, ponto a ponto, a questão”, afirma o presidente do SMetal, Leandro Soares.
O secretário-geral do Sindicato, Silvio Ferreira, aponta ainda que o programa abre brechas para demissão. “Do jeito que está, o Priore não cria mecanismo para impedir que o empresários mandem embora quem está empregado. Isso pode ter um impacto considerável e gerar desemprego na categoria de Sorocaba e Região”.
Muitos outros pontos são problemáticos, como apontado pelo Departamento Jurídico do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal) e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Entenda ponto a ponto o que pode estar em jogo:
O que é o Priore? Como vai funcionar a contratação através desse programa?
SMetal: Poderão ser contratados por meio do Priore trabalhadores de 18 a 29 anos e, também, acima dos 55 anos – que estejam desempregados há mais de 12 meses – recebendo um salário-base mensal de até dois salários mínimos.
Opinião Leandro Soares: “O Priore traz muitas penalidades para o trabalhador, além de afirmar a redução de jornada e suspensão de contrato por acordo individual, contrariando a Constituição, que determina esses tipos de situações devem ter acordo coletivo.
Outro ponto a se destacar é que o programa não é uma política consistente para criação de emprego e tem um viés eleitoreiro, ou seja, vai atrair pessoas desesperadas por um posto de trabalho com menos direitos. Importante enfatizar que o SMetal não é contra propostas que criem vagas no mercado de trabalho, mas cobra que não seja com menos direitos e que seja num processo contínuo”.
Quais são as condições (tanto de salário, quanto de direitos) impostas nesse tipo de contratação?
SMetal: No prazo de 36 meses a contar da vigência da lei, poderá ser realizada a contratação de trabalhadores por meio do Priore e o prazo de duração do contrato de trabalho será de até 24 meses. A alíquota mensal relativa aos depósitos para o FGTS será de 2% para microempresas, 4% para empresas de pequeno porte e 6% para as demais empresas.
Poderão ser contratados por meio do Priore trabalhadores com salário-base mensal de até dois salários mínimos. E esses trabalhadores terão direito ao recebimento do Bônus de Inclusão Produtiva (BIP), que garantirá valor equivalente ao salário mínimo hora e alcançará um quarto do número de horas de trabalho pactuadas, até o limite de R$ 275,00 por mês (considerando o valor atual do salário mínimo).
Opinião Silvio Ferreira: “O Priore, na verdade, cria subempregos. Serão trabalhadores que com menos direitos e que, ao final do contrato, deixam de ter garantias importantes, como FGTS, que será menor. A realidade é que a proposta é boa para o patrão, que vai aumentar seu lucro as custas de inúmeros brasileiros massacrados pelo desemprego e pela custo de vida que sobe a cada dia”.
Qual o impacto previsto na criação de empregos?
SMetal: De acordo com o parecer do relator deputado Christino Áureo (PP/RJ), serão quatro milhões de trabalhadores que farão parte do programa que será vigente até 2026. É importante destacar que a redação prevê que o programa valerá apenas para novos postos de trabalho. Apesar desse dispositivo, que não sabemos como será fiscalizado na prática, fica claro que o programa visa oferecer quatro milhões de trabalhadores às empresas “mais baratos” em comparação aqueles trabalhadores que já exercem suas atividades no local de trabalho.
Opinião Leandro Soares: O melhor caminho para inserir os jovens e reabrir oportunidades para os trabalhadores experientes é pelo próprio crescimento econômico. A base do SMetal pode ser utilizada como exemplo. Entre 2008 e 2014, ao menos 39,41% das contratações foram de jovens de até 24 anos de idade. A partir do momento que tivemos a crise política, causada pelo golpe de 2016 que gerou uma forte crise econômica, a porcentagem de jovens admitidos até 24 anos caiu para 27,40%.
Em outras palavras, entre 2008 e 2014, em média quinhentos jovens de até 24 anos eram admitidos todo mês, após o impeachment até os dias atuais, esse número caiu para duzentas admissões por mês.
O problema é que realmente precisamos criar oportunidades para os jovens, mas a proposta aproveita o contexto para criar uma condição precária de emprego. Outro ponto pertinente é que, quando surgem propostas dessa natureza sempre falam que irá gerar empregos, assim como foi com a reforma trabalhista de 2017 – que não entregou o que foi prometido e sim condições piores aos trabalhadores. Por isso, do ponto de vista técnico, o programa é ruim para os trabalhadores e estimula substituição a médio e longo prazo de mão de obra.
Quantos trabalhadores cada empresa poderá contratar pelo Priori?
SMetal: As empresas só poderão contratar até 25% do total do seu quadro funcional. Empresas com até 10 (dez) empregados poderão contratar 3 (três) empregados pelo programa.
As empresas podem demitir para contratar pelo Priore?
SMetal: O Projeto de Lei está para o Priore está destinado a preencher novos postos de trabalho. Contudo, a “criatividade” do empregador brasileira é tamanha que o SMetal pode enfrentar esse problema e deverá atuar imediatamente.
O contrato sob o regime do Priore terá no máximo 24 meses de duração. Se ultrapassar este período será convertido automaticamente em contrato por prazo indeterminado. Como o MPV determina prazo máximo de 24 meses para que o trabalhador esteja no Priore, se ultrapassado esse interregno, o contrato de trabalho passa a ter prazo indeterminado alterando todas as premissas da contratação, tais como salário, FGTS, INSS e tudo mais.
Opinião Silvio Ferreira: “A medida cria trabalhadores em condições diferentes, mas que estão atuando de forma semelhante. Isso é injusto. É importante lembrar também que, sem mecanismo claros de fiscalização, as empresas podem, sim, demitir para contratar outros trabalhadores pelo programa. Se por um lado o governo cria subempregos para uma parcela das pessoas, de outro abre brechas para muitos trabalhadores podem ir para o olho da rua. Isso pode ter um impacto considerável e gerar desemprego na categoria de Sorocaba e Região. Na primeira vez que tentou criar a Carteira Verde Amarela, o governo Bolsonaro abria a possibilidade para que 7 mil metalúrgicos da nossa base perdessem seus postos de trabalho”
Conclusão: “A conclusão que se tira disso tudo é que o governo não tem compromisso genuíno com uma política de criação de empregos. Ele cria, com finalidade eleitoreira, programas que tem data para começar e terminar. Como laboratório, se vale do desespero de uma população que vê os níveis do custo de vida e do desemprego atingirem patamares que antes nunca foram registrados. O trabalhador e a trabalhadora merecem, sim, seu posto de trabalho, mas com formalidade, direitos e benefícios assegurados. Enquanto houverem condições desfavoráveis para os metalúrgicos, o Sindicato estará lá para cobrar o que lhes cabe de direito”, finaliza Leandro Soares.