A pesquisadora Patrícia Alves será uma das convidadas a participar do evento “Feminismos Negros”, do projeto Mulheres e Luta, nesta quinta-feira, dia 22, no SMetal.
Ela é mestranda em História Cultural pela Unicamp, especialista em Cultura, pela Universidade do Estado da Bahia.
O evento tem como proposta reforçar a luta dos feminismos negro, neste mês da Consciência Negra, e ser um encontro para marcar e colocar em prática a música que Marielle Franco gostava de cantar: “companheira me ajude que eu não quero andar só/ sozinha ando bem, mas com você ando melhor”.
Patrícia atua na área de educação há mais de 10 anos com palestras, projetos e aulas experimentais relacionadas às relações Étnico-raciais, Feminismos Negros, gênero e subjetividades, entre outros.
Confira entrevista da pesquisadora à imprensa SMetal:
Imprensa SMetal: Patrícia, o que é feminismos negros?
Patricia Alves: Você não pode falar por outra pessoa. Quando se fala por alguém não se tem autonomia para isso. Eu sou mulher negra, eu falo a partir do meu lugar. Cada nicho, organização fala de algum local, de um ponto de partida próprio, particular. Então, temos uma briga dessas mulheres negras contra a misoginia e o racismo. Estamos refazendo conceitos, recriando espaços que não eram dados por nós. Sororidade vem muito a calhar nesse momento. Conseguimos ter um chamamento para essa nova roupagem. Feminismos negros são mulheres negras lutando por seus espaços, reconhecendo a si mesmas como negras. Os feminismos vem para isso, para que nos reconheça, para que nos movimentemos para fora. Uma outra leitura de agir, de nós mulheres negras.
Imprensa SMetal: Pelas redes de ativistas nas quais você é inserida, podemos dizer que no Brasil, houve um aumento de movimentos feministas nesses últimos anos, ganhando mais visibilidade?
P.A.: Houve um aumento absurdo de participação das mulheres negras e felizmente, nos últimos 10 anos, isso tomou uma grande proporção e é sensacional. Porque as mulheres negras, cada uma falando do seu local. O cabelo afro que tem vários jeitos de ser, não tem uma forma só.O corpo, a forma de falar, a beleza, a maquiagem. Hoje, fui comprar uma base pro dia a dia com protetor solar e encontrei um produto nacional e a vendedora disse que era para pele negra. Então, esse movimento que é pra fora está acontecendo. Não só porque a gente está se colocando, mas a sociedade está reconhecendo. A questão da sapatilha de balé, que é a extensão do corpo da mulher e hoje tem várias tonalidades, não só rosinhas ou branquinhas. São exemplos bobos, mas para vermos como a sociedade está incorporando. Nós temos criado muitos conceitos com base naquilo que só mulher negra conhece e a tendência é crescer e a gente amadurecer.
Imprensa SMetal: A morte de Marielle comoveu grande parte da população brasileira, mas o que de fato, ela representa?
P.A: Marielle mostrou muito o Brasil que nós temos hoje, machista, racista, misógino, preconceituoso, elitista. Porque ela era uma mulher fora do comum. Ela deu muito certo, apesar da sociedade achar que não daria. Num local onde ela era descriminada.
A favela é o local, onde as pessoas que não moram na favela acham que só tem bandido, pessoas erradas. Infelizmente, essa é a visibilidade que as pessoas veem da favela e que vemos as pessoas reproduzindo.
No caso da Marielle, ela começou um trabalho sensacional. Como a gente sabe que vidas negras, para a maior parte das pessoas, ainda não vale tanto quanto as vidas brancas, a Marielle tocou na ferida. Defendia os meninos que eram trabalhadores, no começo da vida adulta, podendo trilhar outros caminhos. Ela tocou na ferida também nas famílias dos soldados que eram mortos. Ela estava “atrapalhando”. Ela começou a gritar aquilo que as pessoas não queriam ouvir. Marielle deu frutos, deu sementes! Ela fez a diferença! Temos antes e depois de Marielle no Brasil.
Imprensa SMetal: Diante o resultado das eleições como você avalia que deve ser a atuação do movimento feminista e dos movimentos antirrascistas.
P.A.:Temos tudo para crescer com relação aos movimentos feministas e os movimentos antirracistas porque conforme fala muito bem a Angela Davis não basta não ser racista, tem que ser antirracista e tenho gostado de ver os homens lutando com a gente, as mulheres brancas. A gente tem que entender que quando se fala de mulher negra, eu sendo negra, tá falando de mim. Quando o grupo maximiza a sociedade precisa ouvir. Esse encontro que faremos vai trazer mulheres negras de vários mundos possíveis. Precisamos desse diálogo, precisamos nos fortalecer para fortalecer um a outro.
Em relação às eleições, ao presidente eleito, temos muita luta pela frente porque precisamos que as pessoas reconheçam o que foi a escravidão no Brasil. E ainda ouço que escravidão não existiu, que os negros vieram como imigrantes. Temos uma luta grande pela frente, mas já caminhamos muito.