Uma comitiva com três oficiais da Marinha do Brasil fizeram uma visita de inspeção na fabricante de baterias Satúrnia, na manhã desta terça-feira [23], para avaliar se a Marinha mantém ou rompe contrato com a empresa, que deveria ter fabricado uma bateria para o submarino Tupi, que está no estaleiro, no Rio de Janeiro, a espera do produto.
A fábrica recebeu R$ 1,7 milhão de adiantamento da Marinha para fazer o produto, que deveria ter sido entregue em julho, mas com dívidas e sem crédito no mercado, a bateria sequer começou a ser fabricada.
A fabricação de uma bateria de submarino, que é composta por 480 elementos e pesa aproximadamente 270 toneladas, pode demorar até 6 meses. O custo final do produto chega a R$ 12 milhões.
Os oficiais, que disseram não poder falar em nome da Marinha, vão fazer um relatório da visita à fábrica e apresentá-lo ao almirante Francisco Roberto Portella Deiana. Ele quem dará a decisão final se a Marinha mantém ou não o contrato com a Satúrnia.
A Satúrnia, instalada na zona industrial de Sorocaba, está com a linha de produção totalmente parada por falta de matéria-prima.
Os 170 funcionários estão com salários atrasados, sem convênio médico, sem transporte e a empresa também não está recolhendo o FGTS e INSS.
Os trabalhadores estão de licença, mas continuam na empresa para impedir a retirada de equipamentos que possam garantir o pagamento de futuras verbas rescisórias, caso a fábrica venha a falir.
Empresa espera vender terreno ou atrair acionistas
O diretor-presidente da Satúrnia, Luís Antônio Baptista, revelou à Imprensa SMetal Metalúrgica que espera a confirmação do interesse de um investidor de São Paulo que estaria disposto a investir R$ 8 milhões na empresa.
Ele acrescentou que as negociações estão em andamento há um mês, mas não deu prazo para a consolidação das negociações. “Essas coisas não são fáceis”, disse.
Baptista não quis entrar em detalhes sobre a negociação, mas deu a entender que o novo investidor estaria fazendo muitas exigências – como influir na direção da fábrica – para fechar o negócio.
Outra alternativa que a Satúrnia leva em consideração é a venda de parte do terreno da fábrica, que está localizada no bairro Iporanga, zona industrial de Sorocaba. Um investidor imobiliário de Sorocaba estaria disposto a pagar R$ 4 milhões por parte do terreno da fábrica.
Mas como o grupo ALTM, que controla a Satúrnia, está em recuperação judicial, a Justiça poderá barrar a venda do terreno.
Em conversa com o deputado estadual Hamilton Pereira (PT), que também esteve na fábrica na manhã desta terça, Baptista revelou, também, que a Satúrnia ofereceu de 3% a 4% de participação da fábrica à Emgepron, empresa mista que gerencia projetos navais da Marinha.
Cliente tem, então por que a crise?
O diretor-presidente da Satúrnia, Luís Antônio Baptista, é categórico em afirmar que a empresa não está em crise por falta de cliente. “Nossa carteira [de clientes] é muito boa. Hoje eu deixo de vender por falta de produto, não de cliente”, avisa.
Se a empresa tem mercado, porque, então, que está em crise? O mesmo diretor explica que a empresa foi comprada, em 2006, com dívidas tributárias de R$ 60 milhões e um tanto sucateada. “A Eaton [antiga proprietária] queria fechar a fábrica porque àquele grupo não interessava fabricar baterias, mas depois resolveu vendê-la quando viu que fechar ficaria mais caro”.
Comprada em 2006, Baptista conta que as dívidas da Satúrnia estavam equilibradas, mas a crise 2008/2009 levou o grupo ALTM à beira da falência. Como o grupo é o controlador da Satúrnia, a fábrica de Sorocaba ficou sem crédito para movimentar sua produção.
“Essa é a triste realidade que nos levou ao ponto que estamos hoje”, conclui Baptista.
Além de baterias para submarinos, a Satúrnia produz baterias para veículos elétricos tracionados (empilhadeiras e trens do metro) e baterias estacionárias usadas no sistema de telefonia fixa e móvel.
Sindicato contesta versão da empresa, mas quer diálogo
A direção do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba classifica como simplista o argumento do diretor da empresa, de que a crise mundial de 2009 foi a única responsável pelas dívidas da Satúrnia.
Para o Sindicato, se a empresa tem clientes, é líder de mercado e tem potencial de faturamento de mais de R$ 10 milhões por mês, não deveria ter quebrado com abalo econômico que surtiu pouco efeito no Brasil. “As empresas hoje estão até maiores do que antes da crise de 2009. A economia está ainda mais forte”, afirma Alex Sandro Fogaça, diretor do Sindicato e funcionários da Satúrnia.
“No nosso entendimento, houve má gestão e pouco caso por parte dos donos da Satúrnia. Não digo da gerência local, mas da cúpula do grupo ALTM. Eles devem utilizado o faturamento da Satúrnia em investimentos na própria fábrica. Não deveriam também deixar a empresa local pagar pelos desmandos da ALTM, que está em recuperação judicial e prejudicou o crédito da Satúrnia”, analisa Ademilson Terto da Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região.
Para o dirigente sindical e funcionário da Satúrnia, Alex Sandro Fogaça, a empresa não é transparente e o dono da fábrica [Edésio Quintal de Oliveira Quintal] continua inacessível. “É uma falta de respeito, uma indignidade essa falta de transparência dos acionistas e diretores da Satúrnia para com os funcionários e a cidade”.
Muitos trabalhadores, com salários atrasados e benefícios cortados, perderam a confiança na empresa. “A cúpula da Satúrnia é capaz de enrolar até a Marinha”, afirmou à Imprensa SMetal um funcionário (que prefere não se identificar). Outro afirma que está desmotivado: “Mesmo que chegue matéria-prima vai ser difícil se empenhar. Não confio nesse pessoal que ta aí [diretoria e proprietários]. “Quero garantir meus direitos e sair [da fábrica]”, disse um terceiro funcionário, que também pediu para não ter o nome publicado.
O diretor industrial Walter Giamarino Junior admite que a falta de motivação e as inevitáveis baixas no quadro de funcionários são outros desafios que a empresa terá que enfrentar no caso de a produção ser retomada.
Histórico
A Satúrnia tem 82 anos de fundação e chegou a Sorocaba, vinda de São Paulo, no começo dos anos 80.
Ao longo desse período ela sofreu várias mudanças do comando acionário, passando, ultimamente, pelas mãos do grupo Invensys, Eaton e, em 2006, para o controle do grupo ALTM, do Rio de Janeiro, um prestador de serviços para grandes empresas, como a concessionária de energia Light no estado do Rio.
Trabalhadores estão unidos e esperam que fábrica retome a produção e pague os salários atrasados
Diretor Luís Antônio Baptista culpa crise de 2009 pelas dificuldades; Sindicato dos Metalúrgicos contesta e aponta má administração