Sorocaba registrou aumento de 41% nos óbitos causados por complicações geradas pela contaminação do vírus HIV. O levantamento parcial realizado pelo Programa Municipal DST/Aids – de janeiro a novembro deste ano – aponta 55 mortes. No ano passado foram registradas 39 mortes em decorrência da aids, enquanto em 2012 foram 34. Em nível nacional, a taxa de mortalidade por consequência da aids é de 12 mil por ano. Mesmo com uma rede de assistência que é considerada referência, como o Projeto Transmissão Vertical Zero, o Município mostra um cenário que preocupa as Organizações Não Governamentais (ONGs) locais, que se mobilizam pela criação de uma Frente Parlamentar pela Cidadania das Pessoas Vivendo Com HIV e Aids (PVHA).
O requerimento, que marca o Dia Mundial da Luta Contra a Aids, celebrado hoje, foi protocolado na Câmara de Sorocaba, junto à Comissão Permanente de Saúde Pública. Segundo a presidente do Grupo de Educação à Prevenção a Aids em Sorocaba (Gepaso), Lucila Magno, a criação de uma Frente Parlamentar – que seria pioneira no interior do Estado – deve fortalecer mais a luta pelos direitos das pessoas que convivem com o vírus HIV no município. “As pessoas envolvidas com a causa têm muito a contribuir com o Poder Legislativo”, destaca a militante.
Dia de reflexão
Fundadora do Gepaso – entidade pioneira no Estado, com 26 anos de existência -, Lucila ressalta que o dia 1º de dezembro “não é dia de comemoração, mas de reflexão e de reivindicação”. Apesar de reconhecer a necessidade de melhorias na assistência junto ao Sistema Único de Saúde (SUS), Lucila revela que a rede de Sorocaba é mais forte. Ainda assim, destaca ela, a discriminação continua, assim como a cadeia de transmissão e os óbitos no Município.
Lucila Magno explica que, no futuro, o atendimento deverá ser feito diretamente nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs), mas, por enquanto, o que se vê é a falta de capacitação de equipes para a assistência às pessoas que convivem com o vírus HIV/Aids. Ela destaca que para combater o preconceito e a discriminação é importante a realização de campanhas e também o comprometimento das pessoas que defendem a luta contra à aids. Para levar informações aos grupos mais vulneráveis, conta, o Gepaso atua com agentes multiplicadores, inclusive jovens. “Fazemos palestras em que falamos a linguagem do público que queremos atingir. Hoje, por exemplo, não vou falar mais que se deve usar e como se deve usar a camisinha, mas vou cobrar atitudes.”
A displicência e a banalização da doença são alvos de crítica de Lucila. “Pensam que não tem cura, mas existe o controle. Banalizar a aids é banalizar a própria vida”. Lucila observa que ainda hoje há desinformação sobre a doença e que em várias partes do País há falta de comprometimento com os protocolos implantados. Por outro lado, ela elogia programas como o Projeto Transmissão Vertical Zero, em Sorocaba, que têm contribuído para a redução de transmissão vertical do HIV na região. “Com o protocolo da gestante não nasce mais criança com aids. Antes, as pessoas ainda podiam dizer que iam morrer de aids, mas hoje não”, conclui.
Notificação e epidemia
As causas de óbitos que ocorrem por complicações geradas pela contaminação do vírus HIV podem estar relacionadas ao diagnóstico tardio e até mesmo à não adesão ao tratamento, acredita a coordenadora do Centro de Orientação e Apoio Sorológico (Coas) de Sorocaba, Ísis Câmara Barros Teixeira, que afirma que a iniciativa de fazer o teste muitas vezes surge após a pessoa apresentar sintomas. Ísis esclarece que o tratamento exige disciplina e precisa ser contínuo para que haja o controle, sendo que muitos atribuem a dificuldade de continuidade pelos efeitos colaterais causados pelos medicamentos.
Apesar do aumento no número de mortes, Ísis explica que vem crescendo a procura pelos testes rápidos e convencionais. No ano passado, durante a campanha Fique Sabendo, foram realizados 998 testes. No ano todo de 2013, as UBSs realizaram um total de 5.192 testes convencionais (resultado sai em até uma semana), e o Coas fez 3.538 testes rápidos (resultado que sai em 15 minutos). “Esse aumento é positivo. Mostra que as pessoas estão se informando mais e se preocupando mais. Uma vez que descobrem que têm HIV, aderem ao tratamento e, desta forma, reduzem a chance de transmitirem o vírus. É só reduzindo a chance de transmissão que acabaremos com a epidemia”, destaca.
A coordenadora do Coas lembra que a aids é uma doença com notificação compulsória. Em Sorocaba, desde 2010, há queda no número de notificações dos casos. Em 2010 foram notificados 449 casos; em 2013 foram 237; e este ano, o total parcial é de 108 casos da doença. Ela comenta que em algumas regiões foi registrado aumento, mas no Estado de São Paulo e, em especial, em Sorocaba, têm reduzido o número de notificações. Embora não tenha números de pacientes em tratamento, ela afirma que todos os casos positivos para HIV são encaminhados para a rede pública. Quanto à faixa etária de pessoas notificadas, segundo levantamento do Programa Municipal DST/Aids, a maioria têm entre 20 e 49 anos, mas chama a atenção o aumento de casos na faixa dos 20 aos 29 anos. A maior parte dos casos notificados é do sexo masculino.
De acordo com Ísis Teixeira, a epidemia de aids no País se concentra e “anda mais rápido” em alguns grupos, em razão do comportamento sexual. “Está mais concentrada entre os homens que fazem sexo com homens, por conta das parcerias.” Os adolescentes que não viveram a epidemia das décadas de 1980 e 1990 também têm formado outro grupo de risco. “Muitos adolescentes perdem o medo. Acreditam que porque tem tratamento tem controle. Percebe-se que usam preservativo para evitar a gravidez, mas não estão preocupados com a aids”, conclui.