Com uma população estimada de 203,3 milhões habitantes no Brasil em 2014, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Domicílio (PNAD), 98,419 milhões são homens (48,4% do total) e 102,6 milhões mulheres (51,6%). Desse total, 53,6% se autodeclararam negras ou pardas.
Apesar de serem a grande maioria populacional no país, mulheres e negros – junto com povos indígenas, deficientes, homossexuais, travestis e transgêneros, entre outros – são considerados minorias na sociedade quando analisamos os direitos conquistados e a representatividade.
Segundo a professora e coordenadora do Núcleo de Estudo de Gênero e Diversidade Sexual do campus Sorocaba da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), a psicóloga Viviane Mendonça, minorias sociais são definidas como grupos marginalizados dentro de uma sociedade devido aos aspectos econômicos, sociais, culturais, físicos ou religiosos, de gênero ou orientação sexual.
“Não são minorias porque são poucos, mas porque possuem poucos direitos garantidos, pouca representatividade nas instâncias de poder e pouca visibilidade no cenário social”, conta. “São sujeitos que em uma sociedade possuem pouca ou nenhuma voz ativa para intervirem nas instâncias decisórias de poder”, completa.
Para a educadora e atriz Vanessa Soares, coordenadora do grupo Saramuná – que pesquisa e difunde a cultura afro-brasileira -, as minorias são resultado do processo histórico brasileiro. “São pessoas que não estão nas publicidades, nos cargos políticos, nas novelas ou nos grandes escritórios”, exemplifica.
Um estudo sobre perfil social, racial e de gênero, divulgado em maio de 2016 pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIC) e o Instituto Ethos, mostra que apenas 4,7% dos cargos de alto escalão das 500 maiores empresas do Brasil são ocupados por negros e 13,6% por mulheres. Ou seja, eles representam apenas 18,3% em cargos de mais importância.
O estudo demonstra ainda que entre as empresas que buscam promover ações afirmativas de inclusão das minorias sociais, 43,1% têm políticas voltadas para pessoas com deficiência; 28,2% para mulheres; e somente 8% para negros.
A ausência dessas minorias é destaque também nos meios de comunicação. A agência brasileira Heads, com auxílio da ONU Mulheres, realizou uma pesquisa que mostrou o perfil majoritário explorado pela publicidade veiculada na televisão no país.
Segundo o monitoramento feito pela agência, entre os dias 25 a 31 de janeiro deste ano, mais de 90% dos protagonistas das campanhas publicitárias brasileiras eram brancos. Eles contabilizaram mais de 2,3 mil inserções de 30 segundos exibidas em intervalos comerciais de duas emissoras, TV Globo e Megapix.
No campo político a representatividade das minorias sociais também é mínima. “Poucos representantes destas minorias estão no parlamento brasileiro e também no sorocabano, por exemplo, e poucos são aqueles que defendem uma mudança radical na sociedade para que os direitos de grupos minoritários sejam conquistados”, afirma Viviane.
Ela lembra que nas eleições de 2014, das 513 vagas disponíveis para deputados federais, 51 foram ocupadas por mulheres, ou seja, apenas 9,9%. Já no Senado, foram escolhidas cinco mulheres entre as 27 vagas disponíveis. Com isso, a Casa passou a ter 11 senadoras de um total de 81 vagas, o que representa 13,6%.
Nas eleições de 2014 foi a primeira vez que os candidatos tiveram que informar sua cor de pele no registro eleitoral. Com isso, entre os deputados federais eleitos, 81 declararam ser pardos e 22 negros, o que representa 20,1% da Câmara Federal. Os demais afirmaram serem brancos.
Já a proporção de autodeclarados negros entre os 27 eleitos para o Senado foi parecida com a da Câmara: 18,5% – cinco parlamentares.
FONTE: PNDA 2014 (IBGE) e TSE (Tribunal Superior Eleitoral)
Música e dança afro-brasileira como transformadoras sociais
O grupo sorocabano Saramuná nasceu com o objetivo de pesquisar, difundir e dar visibilidade às manifestações afro-brasileiras, na forma da dramaturgia, música e encenação. “Discutimos política, representatividade, o feminismo, oportunidade, política pública, tudo dentro de um ‘fazer cultural'”, conta Vanessa Soares, coordenadora do grupo.
A atriz explica que trabalhou em vários grupos culturais após terminar a faculdade, mas sentia a necessidade de falar da sua história e de ter representatividade no meio teatral. “Eu só era quem passava no fundo do palco.
Não só eu, mas muitos amigos negros também e isso começou a incomodar, a doer muito”, diz.
Assim nasceu o Saramuná. Além de promover espetáculos infantojuvenis, roda de danças e ritmos brasileiros de matriz africana, o grupo participa e realiza debates e encontros sobre questões raciais. “A cultura brasileira é calcada na matriz africana, que é a etnia que mais sofre preconceito”, afirma.
Ela explica que quando estão em um trabalho diretamente com crianças, o lema é tentar mostrar de forma lúdica que há beleza em ser negro, mostrando que não há razão para o preconceito racial.
A educadora diz ainda que grande parte do grupo é formado por mulheres, mas que foi um movimento natural. “A mulher não tem voz, não tem espaço. Na cena artística, muitas vezes o pensamento que guia um trabalho é muito machista”, assegura.
“Como coordenadora do grupo, consigo notar a diferença dessas mulheres de quando elas entram no projeto, no qual vivemos um processo intenso, e depois de um tempo.
Há uma diferença de postura e no viver”, exalta.
Para conhecer mais sobre o grupo Saramuná acesse www.facebook.com/GrupoSaramuna
Vanessa Soares, coordenadora do grupo Saramuná
Movimentos sociais e ativismo político na conquista de espaço na sociedade
Como disse uma certa vez o jornalista, sociólogo e intelectual da Comunicação Muniz Sodré: “O que move uma minoria é o impulso de transformação”.
“Essa transformação se constitui como lutas sociais e articulação das minorias em movimentos sociais, ativismos e coletivos, para que tenham mais representatividade nos espaços políticos, econômicos e culturais”, alerta a psicóloga e professora Viviane.
Para ela, esses movimentos organizados já conquistaram alguns avanços no que se refere aos direitos das minorias. A professora cita a Lei Maria da Penha como uma dessas conquistas, que completou 10 anos este ano. “Mas, por outro lado, ainda temos que lutar, em pleno século 21, contra a cultura do estupro e a violência de gênero, principalmente por saber que o Brasil está em 5º lugar no ranking mundial em que mais mata mulheres”, enfatiza.
Viviane lembra ainda que, apesar da luta do movimento LGBTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais), não há uma lei que criminaliza a homofobia no país.
“Sem falar no racismo, que, embora tenhamos uma conquista por ter se tornado crime, ainda está presente com muita força no país”, completa.
De acordo com ela, a conquista de espaço e visibilidade se torna cada vez mais urgente para estes grupos diante de um cenário de fortalecimento do conservadorismo. “Portanto, ocupar espaços na mídia, nas ruas e nos parlamentos pela luta por mais direitos e pela garantias daqueles já conquistados é, ou deve ser, pauta dos movimentos de grupos das chamadas minorias sociais”, assegura.
“Não são minorias porque são poucos, mas porque possuem poucos direitos garantidos, pouca representatividade” Viviane Mendonça.