O novo ano que se aproxima terá inaugurações de seis montadoras de automóveis, sendo três delas no interior do Estado de São Paulo. São elas: Mercedes-Benz, em Iracemápolis (SP), Honda, em Itirapina (SP), Toyota, em Porto Feliz (SP), além de JAC Motors, em Camaçari (BA), Sinotruk, em Lages (SC) e Foton, em Guaíba (RS).
Esse novo cenário deve-se à expansão do mercado brasileiro verificada nos últimos anos e ao estímulo do Inovar-Auto, regime automotivo em vigor desde 2013, que trata de política de impostos para a cadeira automotiva (montadoras, autopeças, indústrias de máquinas e equipamentos, fundição, etc.).
Conseguimos uma coisa que o Brasil não fez desde Juscelino Kubitschek que é a de domesticar as montadoras. A maior parte desses investimentos, com exceção da Toyota, em Porto Feliz, que já estava previsto, vieram por causa da Inovar-Auto”, explica o coordenador da subseção do Dieese no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Fausto Augusto Junior.
O programa, que tem duração até 2017, nasceu também para fortalecer os fornecedores e incentivar as montadoras a investirem em pesquisa, engenharia e desenvolvimento tecnológico no país.
Total de trabalhadores em montadores no Brasil de 2002 até 2014
Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego – Elaboração: Dieese/SMABC
Continuidade 2017-2021
A configuração do mercado nacional de veículos mudou em menos de 10 anos. Antes, as quatro grandes montadoras Volkswagen, Fiat, Ford e Chevrolet (GM) garantiam 95% de vendas no Brasil. Hoje, elas têm 60% do mercado devido à entrada de novas montadoras, como Toyota, Hyundai, Peugeot, entre outras.
Quando o Inovar-Auto foi lançado o dólar estava a R$ 2, caminhando para um milhão de veículos importados, o que representaria 1/4 do mercado brasileiro. “Isso estava desmontando a cadeia produtiva aqui dentro e também a balança comercial”, relata Fausto. Nesse momento, o governo aumentou em 30% o imposto sobre os importados até a formulação do regime automotivo entrar em vigor.
O Inovar até 2017 deve continuar a empurrar proporcionalmente o índice de nacionalização no país. Com a experiência adquirida, o sociólogo destaca alguns pontos que devem ser melhorados.
O desafio da continuidade inclui os investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Hoje, as montadoras colocam as folhas de pagamento da engenharia como investimento em P&D. Mas segundo Fausto, isso não representa investimento direto no desenvolvimento de novas tecnologias, por exemplo.
Segundo análise de Fausto, para fazer um montadora investir no Brasil nessa área é preciso novas estratégias “porque ela, como empresa de capital estrangeiro, não tem interesse em montar um centro tecnológico de desenvolvimento aqui”. Um exemplo citado por ele é do brasileiro que desenvolveu o UP (na fábrica da Volkswagen de São Bernardo do Campo) e hoje está trabalhando no Centro de Desenvolvimento da Alemanha.
“A GM tem uma estação interessante de desenvolvimento, a Fiat tem uma discussão séria, mas, na média, outras não; e as japonesas raramente levam o desenvolvimento para fora do Japão”, ressalta Fausto.
Outra observação é sobre os segredos industriais que restringem a entrada na fábrica, “não se consegue comprovar diversas exigências e obrigações”. Por isso, o movimento sindical já começou o debate sobre a continuidade e melhorias no regime automotivo.
Eficiência energética e a produção de plataformas
Powertrain
Um dos pontos mais destacados do regime Inovar-Auto é a questão da eficiência energética imposta às montadoras para trazerem motores melhores ao Brasil. Fausto conta que os motores brasileiros até dois anos atrás eram motores de concepção de 10 anos passados. “Então, tem motores muito mais eficientes com tecnologia muito mais avançada atualmente”. Um exemplo, é o Corolla, que na Europa roda com motor 1.3, que é o motor do Etios. “Nós rodamos aqui com motor 1.8 e 2.0. Mas, por que roda com motor 1.3? Porque o motor é muito mais eficiente e tem tecnologia embarcada. Ele roda com 110 cavalos”.
Exemplos de inovações
O motor novo do UP 1.0 é de três cilindros, que roda a 82 CV. Ao mesmo tempo, hoje já coloca um turbo (motor TSI) que chega a 110CV (que era equivalente a 1.6), com um consumo que ultrapassa 20km/litro com gasolina. É um motor absurdamente mais eficiente.
O motor que roda hoje no novo KA, da Ford, tem tecnologia da Nasa (desenvolvida para foguete) dentro do sistema de distribuição dele. É um motor em alumínio, mais leve, mais eficiente.
Essas melhorias são feitas devido às exigências de se acertar o índice de nacionalização e para atingir os índices de eficiência. “Não sei qual vai ser esse motor da Toyota, da nova fábrica de Porto Feliz, mas pega um motor da Honda, no FIT, é 1.3 com eficiência de motor 1.0. O FIT 2008/2009 não passava no controle de emissão por causa do motor. E a Honda teve que trazer outro motor”, explica.
Carenagem
A segunda parte do automóvel é a carenagem (a capa metálica que cobre o carro) e cada país tem um gosto por estilo. Fausto avalia que o segmento a nível mundial caminha para se ter, cada vez mais, plataformas globais (o chassi, parte debaixo do carro), que vai suportar todo o resto.
Como essas plataformas tendem a ser modulares terão poucas plataformas no mundo e os países colocam a carapaça e o powertrain que quiserem.
O Gol, Voyage e a Saveiro compartilham as plataformas. De acordo com Fausto, a Volkswagen trabalha com a ideia de ter quatro plataformas no mundo. A Ford, 10 no máximo e a Fiat fala em ter oito.
“O nosso embate hoje, do Inovar, é o Brasil fabricar plataformas. A produção dessas plataformas não será em todos os países, apenas três ou quatro lugares do mundo. Por enquanto, estamos com a da Ford, que é a do Fiesta. E aqui no ABC estamos lutando para trazer a da Volks em 2016 e isso deve acontecer também com a Toyota”.
Como produtor de plataformas, crescem as chances do Brasil exportar para uma boa parte do mundo. Provavelmente, quem vai produzir é o país de origem da marca, mais a China por causa do mercado enorme, e devemos ter na América, que vai ser ou Brasil, Estados Unidos ou México.
Livro faz um raio-x no segmento em 10 anos
A obra “As faces da indústria metalúrgica no Brasil: Uma contribuição à luta sindical”, lançada em agosto deste ano, pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) traz capítulo sobre o segmento automotivo e aborda o crescimento do mercado brasileiro.
Com 496 páginas, o livro apresenta um mapeamento dos segmentos que compõem a metalurgia, como aeroespacial e de defesa, bens de capital, mecânico, eletroeletrônico, construção naval e siderurgia e metalúrgica básica.
No capítulo 2 “Diagnóstico do segmento automotivo” consta a caracterização, o histórico e a evolução do segmento no Brasil, com dados comparativos mundiais. Entre os autores estão os economistas da subseção do Dieese SMetal, André Corrêa e Fernando Lima e o sociólogo do Dieese ABC, Fausto Augusto Junior.
“Enquanto a produção mundial cresceu 48,1% entre 2002 e 2013, a brasileira apresentou crescimento de 107%.”
No ranking dos maiores países produtores de veículos do mundo o Brasil saltou de 11º colocado (1.791.530) em 2002 para 7º colocado em 2012 (3.712.380).
Conheça mais o Inovar-Auto
O governo federal, por meio do Inovar-Auto, abre mão de impostos para, em contrapartida, incentivar as empresas a investirem em desenvolvimento tecnológico, pesquisa e inovação e fortalecer o setor automotivo e toda a cadeia produtiva envolvida.
O Regime estipula que das 12 etapas de fabricação do automóvel, oito devem ser realizadas no País e; das 14 etapas de fabricação de caminhões, dez sejam nacionalizadas.
Metas energéticas: a média dos veículos dos beneficiários do regime comercializados a partir de 2017 terá de consumir 12,08% menos combustível do que atualmente. Ou seja, na média, os veículos deverão passar dos atuais 14 km/litro para 17,26 km/litro para gasolina e 9,7 km/litro para 11,96 km/litro no caso do etanol.
Montadoras e as remessas de lucros
As montadoras, no Brasil, não são Sociedades Anônimas e por isso, não são obrigadas a informar seus balanços. Não é como a Petrobras, Banco do Brasil, por exemplo. Esse é um grande problema para o movimento sindical, pois não há como afirmar o lucro das montadoras no país. Segundo Fausto Augusto, o que se consegue observar são os balanços mundiais que, na rubrica, alguns incluem América Latina. Nesse campo dá para intuir um dado nesse sentido de margem de lucros.
Ele destaca que até pouco tempo atrás todo mundo usava os dados de remessa de lucros, do Banco Central, para dizer que as montadoras tinham uma margem de lucro extraordinária no Brasil.
“De fato, as montadoras ganharam muito dinheiro ao longo de 2002 (1,6 milhões de veículos) até bater 3,6mi, quando as vendas mais que duplicaram”.
Mas não foi só isso, lembra: “o Brasil tinha o carro mais caro do mundo, em dólar”.
Remessa de lucro da indústria automobilística 2005-2015 (em US$ milhões)
Fonte: Banco Central do Brasil – Elaboração: Dieese/SMABC
Crescimento das montadoras tem reflexo em Sorocaba
O economista da subseção do Dieese no SMetal, Fernando Lima, aponta que o crescimento da produção de veículos, de fato, repercute na região de Sorocaba com a geração de empregos nas fábricas de autopeças e na montadora Toyota.
No gráfico 2, pode-se verificar que em 2002 o número de trabalhadores no complexo automotivo (empresas de autopeças e montadora) na base do SMetal, que inclui Sorocaba e mais 13 cidades, progrediu de 5.979, em 2002, antes do governo Lula, para 12.589, no ano passado. Essa evolução representa um aumento de 110%, com a criação de 6.610 postos de trabalho.
“Programas como o Inovar-Auto, que privilegiam o conteúdo brasileiro, proporcionam manutenção de empregos no País e nas regiões onde as indústrias estão instaladas, geram novos investimentos e nacionalizam tecnologias utilizadas na produção”, avalia Leandro Soares, secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal).
Produção total de veículos no Brasil
Fonte: Anfavea – Elaboração: Subseção Dieese SMetal
Mudança na dinâmica do mercado de trabalho na regão de Sorocaba
Fonte: RAIS/MTE (2014) – Elaboração: Subseção Dieese SMetal