O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou hoje (20) denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) na qual acusa o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de receber pelo menos US$ 5 milhões em propina. O valor teria sido pago para tornar viável a construção de dois navios-sonda da Petrobras, entre junho de 2006 e outubro de 2012. Na denúncia, Janot pede a condenação de Cunha pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
De acordo com a Procuradoria, Cunha recebeu vantagens indevidas para facilitar e viabilizar a contratação do estaleiro Samsung, responsável pela construção de dois navios-sonda. Segundo a denúncia, a intermediação foi feita por Fernando Soares, operador ligado à Diretoria Internacional da Petrobras, indicado pelo PMDB. “A propina foi oferecida, prometida e paga por Júlio Camargo”, diz o Ministério Público Federal, referindo-se ao lobista que aderiu à delação premiada.
“Por causa dos contratos, a Samsung transferiu, em cinco parcelas pagas no exterior, a quantia total de US$ 40,355 milhões para Júlio Camargo, que em seguida transferiu, a partir da conta mantida em nome da offshore Piemonte, no Uruguai, parte desses valores para contas bancárias, também no exterior, indicadas por Fernando Soares”, acrescenta o Ministério Público. “Cunha é acusado de lavagem de dinheiro por ocultar e dissimular o recebimento dos valores no exterior em contas de empresas offshore e por meio de empresas de fachada.”
Segundo Janot, para dar aparência lícita à movimentação de propinas foram celebrados dois contratos de comissionamento entre a Samsung e a empresa Piemont, de Júlio Camargo. ” Dessas comissões saíram as propinas prometidas a Fernando Soares, Eduardo Cunha e ao então diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, que levou a questão à Diretoria Executiva e obteve a aprovação dos contratos relativos aos navios-sondas, nos termos propostos pela Samsung.”
Conforme as investigações da Operação Lava Jato, depois do recebimento das sondas a Samsung deixou de pagar comissões para Júlio Camargo, o que inviabilizou o repasse da propina. “Com isso, Eduardo Cunha passa a pressionar o retorno do pagamento das propinas, valendo-se de dois requerimentos perante a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, formulados pela então deputada Solange Almeida, em julho de 2011.” A ex-parlamentar também está sendo denunciada pelo MPF, por corrupção passiva.
Os requerimentos – ao Tribunal de Contas da União e ao Ministério de Minas e Energia – pediam informações sobre Camargo, a Samsung e o Grupo Mitsui, que participação das negociações do primeiro contrato. “Segundo Janot, a ex-deputada tinha ciência de que os requerimentos seriam formulados com desvio de finalidade e abuso da prerrogativa de fiscalização inerente ao mandato popular, para obtenção de vantagem indevida. Para ele, não há dúvidas de que o verdadeiro autor dos requerimentos, material e intelectual, foi Eduardo Cunha.” Pelas investigações, o agora presidente da Câmara usou sua senha pessoal para elaborar os requerimentos, que depois foram autenticados por Solange.
Ainda conforme a denúncia, os pagamentos foram retomados por volta de setembro de 2011, após reunião entre Soares, Camargo e Cunha. “O valor restante foi pago por meio de pagamentos no exterior, entregas em dinheiro em espécie, simulação de contratos de consultoria, com emissão de notas frias, e transferências para igreja vinculada a Eduardo Cunha, sob a falsa alegação de que se tratava de doações religiosas.”
O procurador-geral pede, além da condenação criminal, a restituição do produto e proveito dos crimes no valor de US$ 40 milhões. A título de reparação de danos causados à Petrobras e à administração pública, pede valor equivalente.
‘Consciência tranquila’
“Estou absolutamente sereno e refuto com veemência todas as ilações constantes da peça do Procurador-Geral da República”, afirmou Cunha, por meio de nota. “Estou com a consciência tranquila e continuarei realizando o meu trabalho como Presidente da Câmara dos Deputados com a mesma lisura e independência que sempre nortearam os meus atos, dentro do meu compromisso de campanha de ter uma Câmara independente. Esclareço, ainda, que o meu advogado responderá sobre fatos específicos referidos na denúncia.”
Ele afirmou que foi “escolhido” para ser investigado e agora, para ser denunciado. Cunha disse respeitar o MPF, mas acrescentou que não se pode confundir “trabalho sério com trabalho de exceção”, que estaria sendo feito por Janot. Também disse achar estranho que a denúncia seja divulgada às vésperas de manifestações, segundo ele, vinculadas ao PT, atos que teriam como um dos objetivos atacá-lo. Cunha estranhou ainda não haver denúncia “contra membro do PT ou do governo, detentor de foro privilegiado”.
“Por fim, registro ainda que confio plenamente na isenção e imparcialidade do Supremo Tribunal Federal para conter essa tentativa de injustiça”, finalizou.