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Indígenas: Resistência e preservação cultural

Indígenas passam mais de quatro anos estudando fora das aldeias, em salas de universidade para transformar o conhecimento em ferramenta de preservação da cultura

Fernanda Ikedo/Revista Ponto de Fusão

Tukano, Guarani, Terena, Tupiniquim e Xavante, são algumas etnias indígenas, de diversas regiões do país, que estudam ou já estudaram no campus de Sorocaba da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).

O programa recebe estudantes indígenas desde 2008 no campus e neste ano se formarão os três primeiros graduandos, um em geografia e dois em pedagogia.

Atualmente, 15 indígenas estão matriculados no campus Sorocaba, mas ao todo, a UFSCar atende 91 estudantes indígenas.

Para frequentar a sala de aula na universidade pública eles contam com o apoio da comunidade para irem estudar, porque têm que deixar as aldeias e seus costumes para enfrentar um choque cultural e comportamental, numa cidade de concreto e asfalto, calor abrasador ou frio excessivo e roupas demasiadas.

Para o professor Hylio Lagana Fernandes, que coordena o Programa Especial de Treinamento – PET Indígena – do campus Sorocaba da UFSCar, os indígenas proporcionam trocas culturais enriquecedoras.

Ele conta que quando assumiu o Programa tomou conta da “gigantesca ignorância sobre esse universo, que tem outra lógica que rege o pensamento e que, ao mesmo tempo, fascinava e incomodava”. Após uma imersão nessa cultura Fernandes acabou sendo batizado xavante.

Os valores e costumes indígenas estão muito ligados à natureza. Além da alimentação natural, outro ponto forte das aldeias é a integração com o meio ambiente. Conforme Hylio observa, os alunos indígenas, na cidade, sentem uma tristeza em ver o meio ambiente sendo destruído pelo ser humano, ao invés do oferecimento de cuidados pela energia que ele nos fornece. Para os indígenas, são claras as consequências da exploração indevida, como enchentes ou falta de água, entre outras.

Riqueza desconhecida

Por meio da fala de dois estudantes ouvidos pela Ponto de Fusão, José Robri, da aldeia Hu´UHI (osso de onça) e Laerte Rupre, de Owau (água quente), ambos do Mato Grosso e estudantes de pedagogia, percebe-se a vontade de retornar às respectivas comunidades para levar o conhecimento adquirido, mas vai muito além disso.

“A gente planta o que come, mas a cultura capitalista é muito forte e acaba entrando nas aldeias e agora alguns alimentos também vêm de fora”, relata José Robri, que entrou no curso de pedagogia em 2009. A preocupação dele são as mudanças que vêm ocorrendo na sua aldeia. “Como a gente vai preparar os jovens? Tudo isso é bem difícil”.

Por isso, é importante sua jornada como estudante, para retornar com a experiência e contribuir com projetos voltados à sua cultura. “A nossa jornada é um ciclo, tem que voltar para trabalhar para a comunidade. Esse é o meu propósito”.

Rupre ressalta: “para nós, existem dois mundos: o mundo indígena e o mundo não-indígena. O mundo é bem chocante, tanto na língua, quanto na cultura e a mercadoria também. Estamos ainda refletindo com a comunidade como a gente vai caminhar”.

Como nessa batalha de resistência cultural faltam instituições e projetos que apoiem as nações indígenas, eles utilizam a entrada na universidade para transformar conhecimento em ferramenta para se pensar na preservação da comunidade. “A busca é infinita para nós, sempre buscando um novo caminho”, afirma Rupre.

José Robri quer retornar para a tribo e contribuir para fortalecimento de sua cultura

Vestibular Indígena

Conforme informações da assessoria de imprensa do campus da UFScar Sorocaba, há alunos indígenas, por exemplo, nos cursos de Engenharia Florestal, Ciência da Computação, Economia, Geografia, Pedagogia entre outros.

A Universidade Federal oferece uma vaga em cada um dos seus cursos de graduação para indígenas. Se um curso oferecia normalmente 60 vagas, ele passou a oferecer 61 vagas para contemplar indígenas.

É realizado anualmente um processo seletivo específico, o Vestibular Indígena. Ou seja, para o ingresso, os indígenas só concorrem entre eles. Neste ano, o vestibular Indígena teve suas inscrições abertas de 29 de junho a 4 de setembro.

Vá ao museu e conheça mais sobre as aldeias indígenas

Conforme o arqueólogo sorocabano Wanderson Esquerdo Bernardo, autor do projeto “Gêneses Sorocabana”, o Museu Histórico Sorocabano é o único que abriga a cultura indígena na cidade. “Fora isso só resta a toponímia (os nomes indígenas de alguns bairros de Sorocaba e de alguns rios e afluentes). No entanto, Sorocaba e região contaram com várias aldeias indígenas”.

Em suas pesquisas Wanderson apontou que em um mapa de 1640, o holandês Jansenius Blaeu determinou o território tupiniquim, e dentro dele a Vila de São Filipe (atual bairro do Itavuvu/Sorocaba), e o rio Sorocaba, afluente do rio Tietê. Mapa que coincide com outros mapas coloniais da época.

O arqueólogo conta que quando o bandeirante Baltazar Fernandes fundou Sorocaba em 1654, construindo sua casa grande e uma capela, “as aldeias indígenas da região já não existiam (ou pelo menos restava apenas uma onde foi erigida a capela na época da fundação) por causa da sistemática escravidão que os indígenas foram submetidos”.

As pesquisas de Wanderson se iniciaram em 1995 e ele trabalhou com objetos indígenas encontrados, acidentalmente, em sítios arqueológicos na região de Sorocaba, devido à expansão das cidades. Com eles, foi possível descobrir um pouco mais sobre a arte, os ritos, a distribuição espacial das aldeias e outras valiosas informações sobre a cultura indígena.

Diferentes materiais foram encontrados em bairros de Sorocaba, como Laranjeiras e Minerão, e em cidades como Iperó e Sarapuí. Entre eles, estão urnas funerárias e alguns vasos de cerâmica.

Esses objetos pertencem a antigas aldeias tupi e contam com diversos tipos de ornamentos nas cerâmicas, influência da proximidade do povo guarani, na bacia do Rio Sorocaba. A última urna funerária encontrada em Sorocaba foi em setembro de 2006, quando a prefeitura estava construindo uma praça no Jardim Vila Harmonia (Bairro do Éden).

Wanderson publicou sua pesquisa, em espanhol, na edição nº 8, da Revista Textos Antropológicos, da Universidade de San Andres/Bolívia.

Peças indígenas são expostas no Museu Histórico Sorocaba, que fica dentro do Zoológico Municipal Quinzinho de Barros

População das principais etnias indígenas brasileiras

Ticuna – 35.000
Guarani – 30.000
Caiagangue ou Caigangue – 25.000
Macuxi – 20.000
Terena – 16.000
Guajajara – 14.000
Xavante – 12.000
Ianomâmi – 12.000
Pataxó – 9.700
Potiguara – 7.700

No Estado

A população indígena no Estado de São Paulo, segundo o Censo de 2010, é de 41.794 habitantes, que na sua maioria (37.915 índios) vive em cidades (IBGE, Censo 2010).

Os índios representam 0,1% da população total do estado.

As terras indígenas em São Paulo estão sujeitas a uma grande diversidade de pressões e ameaças especialmente de empreendimentos imobiliários e de interesses de mineradoras, que as colocam em situação de vulnerabilidade.

Fonte: Funai (Fundação Nacional do Índio)

Indígenas: Resistência e preservação cultural

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