O anúncio de extinção do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) feito pelo presidente eleito Jair Bolsonaro na quarta-feira, dia 7, preocupa especialistas da área trabalhista.
Em declaração prestada ao SMetal, o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho de Campinas, João Batista Martins Cesar, ex-procurador do trabalho, deixou claro que espera que o presidente eleito reveja a decisão.
“Em um país que a servidão humana perdurou por cerca de 300 anos é indispensável um Ministério que dê o valor que merece o trabalho humano. Essa pasta deve ser capaz de aproximar as forças produtivas do país, capital e trabalho, sempre com o escopo de fazer valer o comando constitucional da busca pelo pleno emprego e da melhoria continua da qualidade de vida do brasileiro”, afirma.
João Batista pontua também que em um mundo globalizado, as relações de capital e trabalho tornam-se mais complexas, exigindo-se uma estrutura administrativa adequada para enfrentar esses novos desafios. “Ao mesmo tempo enfrentar as mazelas decorrentes da herança escravocrata, que ainda hoje atormenta milhares de brasileiros que são resgatados em condições de trabalho análogas à escravidão, bem como a triste constatação da discriminação remuneratória de gênero que ainda persiste em nossas relações laborais, conforme demonstram os dados públicos”.
Ao invés de extinguir a pasta Ministério do Trabalho o desembargador ressalta que ela deve ser equipada com recursos humanos e materiais para cumprir o comando constitucional do pleno emprego, do combate a todas as formas de discriminação.
Como advogada trabalhista e sindical há mais de 20 anos, Erika Mendes, avalia que os retrocessos anunciados durante a campanha estão apenas começando, frente às declarações públicas já prestadas durante a campanha e que agora estão sendo confirmadas.
Para a advogada, “essa conduta de extinguir o Ministério do Trabalho e relegá-lo a parte de qualquer outro ministério demonstra, com clareza, quão irrelevante o novo governo entende serem questões relativas a averiguação de condições de trabalho e acidente, fiscalizações quanto ao cumprimento da legislação trabalhista e velar pelo respeito e observância dos direitos trabalhistas mínimos”.
Outras esferas de atuação
Erika esclarece que a pasta MTE também atua na mediação em greves e em impasses nas negociações entre sindicatos e empresas e conjuntamente com o Ministério Público do Trabalho como, por exemplo, na fiscalização e medidas relativas ao trabalho escravo.
“A extinção anunciada mostra a evidente intenção de fragilizar os trabalhadores tornando mais difícil a solução de seus problemas, bem como de muitas questões sindicais, o que representará piora nas relações de trabalho e das condições de trabalho e vida. O prejuízo para a sociedade é gritante”, pontua.
Bolsonaro e equipe seguem a cartilha dos empresários, que tiveram a conquista da Reforma Trabalhista com Temer e, agora, cobram a extinção da pasta.
As entidades patronais Abimaq, Abinee, Abicalçados, Abiquim, Abit, Abrinq, Anfavea, AEB (do Comércio Exterior), Cbic (da Construção Civil) e Instituto Aço Brasil entregaram uma carta ao futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM/RS) a junção em pastas de indústria e trabalho.
Para o presidente do SMetal, Leandro Soares, um Ministério que há 80 anos luta pelos direitos dos trabalhadores, na fiscalização do trabalho, não deve ser extinto porque aumentam as possibilidades das empresas oferecem trabalho precário e análogos ao escravo, como pontuou acima o desembargador João Batista.
“Se isso realmente vir a acontecer, será um retrocesso gigantesco que irá impactar no dia a dia do trabalhador. Mais uma vez, o sindicato se afirma como ferramenta de luta para enfrentar as possíveis mudanças nas relações de trabalho, que tendem a ir na contramão do trabalho digno”, ressalta.
Manifestações contra o fim da pasta
NOTA DA IPEATRA
O Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho (Ipeatra) tornou público o posicionamento contra a extinção do Ministério do Trabalho , anunciada pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro.
“A Constituição da República, promulgada em 5 de outubro de 1988, desenha a ordem econômica e financeira brasileira fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa (art. 170). O equilibrio entre o trabalhador e a empresa, ao assegurar uma vida digna, é essencial para a construção de uma sociedade mais justa, solidária e democrática.
A existência de uma pasta ministerial autônoma, voltada à análise e regulação das condições de trabalho, ao diálogo social tripartite (entre sindicatos, empresas e governo), bem como especializada em tratar as políticas públicas de promoção de emprego, é indispensável para se cumprir com os fundamentos e objetivos estabelecidos na Carta Cidadã (art. 1º e 3º)”.
Adriane Reis de Araujo
Presidente
NOTA DA ABRAT
A Advocacia Trabalhista Brasileira, representada pela Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (ABRAT), entidade que congrega 26 associações estaduais de profissionais dessa seara do direito, manifesta APREENSÃO E ALERTA em relação à declaração, nesta quarta feira (07/11), do presidente eleito Jair Bolsonaro de que o Ministério do Trabalho será extinto e suas funções incorporadas a outras pastas.
No cenário brasileiro de: 1- aumento do desequilíbrio nas relações capital x trabalho; 2- 12,4 milhões de desempregados; 3- trabalhadores em condições análogas a de escravo que ainda é uma realidade de direitos humanos que persiste no Brasil, reconhecidamente pelo Governo Federal perante a OIT; 4- crescente índice de trabalho infantil; 5- enfraquecimento e até mesmo extinção de entidades sindicais e 5-legislação do trabalho recém reformada pela casa legislativa (Lei 13467/2017), anunciar a extinção do Ministério do Trabalho e a incorporação em outras pastas, pulverizando as atribuições de sua competência, significa relegar para segundo plano, fundamentos republicanos constantes na Constituição Federal de valores sociais do trabalho, da livre iniciativa e da dignidade da pessoa humana.
A Constituição Cidadã deu relevo especial ao trabalho, reconhecendo-o como direito social fundamental e seus valores possuem preponderância na configuração da ordem econômica e em relação aos demais valores da economia de mercado.
Se o trabalho é fundamental e possui espaço de notoriedade na ordem jurídica constitucional, obrigatoriamente deve ser destacado sob pena de violação de clausulas pétreas da CF.
O Ministério do Trabalho em seus 88 (oitenta e oito anos) de existência, desenvolve trabalho de fiscalização e regulamentação de todos os aspectos referentes às relações de trabalho no Brasil.
Enxugar a máquina pública, não pode em nenhuma hipótese significar o ressecamento de valores e dados abarcados pelo órgão ministerial ao largo de sua existência.
A intenção manifestada pelo Presidente eleito implica em quebra da ordem constitucional e do estado democrático, na medida em que ao Estado cabe a missão de mediar processos sociais, políticos e econômicos que busquem o refreamento das desigualdades e de uma melhor divisão de recursos que proporcionem o cumprimento do art. 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos “[…] todo homem tem direito ao trabalho, à livre eleição de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego”
Extinguir um órgão que fiscaliza, detém dados das relações capital e trabalho e que estabelece políticas públicas de promoção de emprego, significa retrocesso social contrários à Constituição Federal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos e qualquer mudança nesse aspecto necessitaria minimamente que a sociedade brasileira fosse ouvida em um diálogo social imprescindível para que, a partir de então se estabelecessem mecanismos institucionais de melhoria da garantia de acesso aos direitos sociais.
Desaparecer com o órgão responsável por esses mecanismos retorna o país ao sistema feudal, eliminando junto com o Ministério os avanços perpetrados no mundo do trabalho que compatibilizam o trabalho humano com a livre iniciativa e com princípios da ordem econômica que devem estar atreladas à valorização do trabalho humano, cuja finalidade é garantir a todos e todas a existência digna.
A medida afronta, ainda, no plano internacional, uma tradição de todos os países latino-americanos, que possuem, sem qualquer exceção, pastas próprias para o trabalho, tornando o Brasil uma absurda exceção no cenário internacional.
A ABRAT alerta para os compromissos subscritos na Convenção 81 da OIT, que trata da inspeção e fiscalização do trabalho, que representa a veia pulsante do Ministério do Trabalho, mormente em um país com altos índices de adoecimento e acidentes decorrentes da atividade laborativa.
A ABRAT se mantém na defesa incansável dos direitos sociais, da dignidade da pessoa humana, do estado Democrático de Direito e se manterá alerta e atuante a toda e qualquer tentativa de rompimento com as estruturas constitucionais que representem retrocessos no mundo do trabalho.
ALESSANDRA CAMARANO MARTINS
Presidente da ABRAT
NOTA DO SINAIT
O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho – SINAIT está acompanhando, por meio da imprensa, as declarações do presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro, e de integrantes de sua equipe acerca do futuro do Ministério do Trabalho. Ao mesmo tempo que acompanha, busca interlocução com a equipe de transição, uma oportunidade para contribuir em uma decisão de tamanha repercussão e magnitude.
Para o SINAIT, o melhor caminho é a manutenção do Ministério do Trabalho, por sua importância no cenário nacional. É preocupante que a declaração de extinção do Ministério do Trabalho não venha acompanhada de detalhes sobre os desdobramentos de acomodação dos serviços prestados à sociedade brasileira, especialmente quanto à unidade das atribuições da Auditoria-Fiscal do Trabalho, espinha dorsal do Ministério do Trabalho.
A preservação da unidade de atribuições contribui para a otimização do esforço fiscal estatal, com manutenção do alto nível de eficiência e redução dos custos da máquina pública. A Auditoria-Fiscal do Trabalho concentra tanto a expertise da fiscalização do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, da contribuição social e do Seguro-Desemprego, quanto a da inspeção dos ambientes de trabalho com ênfase na redução dos acidentes e adoecimentos, que tanto impactam nas despesas públicas previdenciárias e de saúde.
Carlos Silva
Presidente do SINAIT?
NOTA DA CUT
A CUT repudia e contesta a extinção do Ministério de Trabalho anunciada na tarde desta quarta-feira (7) pelo presidente eleito Jair Bolsonaro. Se não for mais uma bravata, a medida representa mais um desrespeito à classe trabalhadora e um serviço aos patrões. Fechar um espaço institucional, em nível de governo, de discussão, balizamento e regulação das relações capital-trabalho significa fechar um canal de expressão dos trabalhadores.
Ao fazer esse anúncio em meio a uma coletiva de imprensa genérica e sem apresentar nenhuma informação sobre o destino que dará a toda estrutura técnica sob o guarda-chuva do ministério, Bolsonaro revela seu total desprezo aos trabalhadores, trabalhadoras e ao mundo do trabalho.
O MT, que em 26 de novembro completa 88 anos, é essencial à classe trabalhadora, ainda mais após a nefasta reforma trabalhista aprovada pelo governo ilegítimo de Michel Temer, que rasgou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
Em um País com quase 13 milhões de desempregados e 43% dos trabalhadores e trabalhadoras na informalidade, a única razão para tal medida é a perseguição à classe trabalhadora e às instituições que a representam.
Com a extinção, os patrões ficarão livres para descumprir as leis, porque é o Ministério do Trabalho que fiscaliza, coíbe e pune abusos por parte dos empresários contra trabalhadores na cidade e no campo. Fiscaliza o trabalho escravo, hoje flagelo de 370 mil brasileiros e brasileiras. Resgata trabalhadores dessa “escravidão moderna” – foram 341 resgatados em 2017, queda brutal em relação a 2015 (1.010), porque Temer cortou investimentos.
O Ministério do Trabalho também fiscaliza o registro profissional, o cumprimento de direitos como férias, 13º salário, coíbe a jornada abusiva, faz a gestão do FGTS, do Sine (Sistema Nacional de Emprego), além de ser o responsável pelo salário desemprego.
O fechamento do MT abre o caminho para o próximo governo fechar também a Justiça do Trabalho.
Vagner Freitas
Presidente Nacional da CUT