Há nove anos trabalhando como pintor em uma multinacional, F* não imaginava que seria demitido após informar à empresa que estava sentindo dores fortes nos ombros. Na época, ele repetia os mesmos movimentos com os braços por, pelo menos, duzentas vezes ao dia. Alcançar a produtividade necessária para pintar centenas de carros, em uma jornada de 8h de trabalho, o levou a um diagnóstico muito comum em trabalhadores do chão de fábrica: Lesão por Esforço Repetitivo (LER).
F* buscou o Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal) quando foi desligado da empresa e, após intervenção do departamento jurídico, foi reintegrado ao trabalho em uma função compatível à sua limitação de movimentos. Os reflexos da lesão no ombro, no entanto, seguem com ele. “Evito até carregar meu filho no colo, pois qualquer movimento diferente começa a doer mais do que o normal”, conta o metalúrgico.
A Lesão por Esforço Repetitivo (LER) e os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) são as razões pelas quais mais de duzentos trabalhadores sorocabanos, entre 2016 e 2021, tiveram problemas de saúde. “A LER/DORT começa devagar. O trabalhador apresenta fadiga, queixa de dor muscular, observa limitação de movimentos. Às vezes, se torna um desconforto que a pessoa atribuí até mesmo a outros fatores que não às doenças”, esclarece Paulo Cordeiro, médico do trabalho no SMetal.
No consultório de Paulo, diversos trabalhadores como F* chegam com quadros muito parecidos. Ele comenta que a maioria exerce atividades em linha de produção e trabalham com ombros elevados. Neste bojo, funções que envolvem transporte e manipulação de peças e volumes também figuram os casos. “São várias situações em que o funcionário pode ter o emprego de esforço físico e ritmo intenso. A pressão psicológica para exercer a função e bater meta de produção é muito forte”, explica.
Como reportar?
O primeiro passo, quando apresentar sinais parecidos como os que foram descritos, é buscar a medicina do trabalho da empresa. Na consulta, o médico deverá fazer uma anamnese – que é o histórico de todos os sintomas narrados pelo paciente – e em seguida exames físicos.
A partir da localização e identificação do tipo de dano físico, o profissional da saúde solicita exames de imagem que podem demonstrar as lesões ou alterações anatômicas da região afetada. Com isso é mais fácil avaliar o quadro clínico e fazer planos de tratamento ou prognóstico.
O Sindicato dos Metalúrgicos recorda que, em situações em que a empresa se recuse a atender às demandas do trabalhador, é possível acionar o departamento jurídico da entidade. “Uma vez que um problema desenvolvido durante o trabalho é uma responsabilidade da fábrica, não podemos deixar que a mesma se isente de prestar o suporte correto à categoria”, comenta Leandro Soares, presidente do SMetal.
Tratamento
Existem casos mais leves como o de F*, em que não há rupturas ou lesões graves, o tratamento é o uso de anti-inflamatórios, exercícios de reforço muscular e sessões de fisioterapia. Além disso, é muito importante adequar a função à limitação daquele funcionário, para que os esforços não voltem a apresentar o desgaste que gera a LER/DORT.
É importante ressaltar que, mesmo em casos de baixa gravidade, o tratamento pode perdurar por um tempo. “Trato até hoje. Tenho acompanhamento médico mensalmente, uso medicamentos e, quando necessário, preciso ir às sessões de fisioterapia”, comenta o trabalhador.
Em casos de rupturas de tendões (parciais ou totais) o tratamento também será mais complexo, o médico ouvido pela reportagem comenta que “quando já existem lesões mais graves, além da restrição de trabalho, indica-se o tratamento cirúrgico”.
O profissional reforça que pelo menos 90% das pessoas que passam por esse processo não conseguem voltar para sua função de origem. Nesses casos (e não somente) é importante ter o respaldo jurídico para entender quais são seus direitos com relação às doenças.
Prevenção
Quando falamos em LER/DORT a melhor forma de frear o surgimento de novos casos é a prevenção. Por isso, um ambiente de trabalho adequado às Normas Regulamentadoras (NR’s) exigidas é primordial. A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) também é uma vertente que pode auxiliar na fiscalização e melhorias no local de trabalho.
O diretor sindical e coordenador de assuntos de saúde do SMetal, Francisco Lucrécio Junior Saldanha, afirma que a atuação dos cipeiros precisa estar alinhada com a atuação sindical. “A CIPA, aliada ao trabalho sindical que desenvolvemos cotidianamente, é fundamental para reduzir o número de trabalhadores afetados pela LER/DORT. O SMetal tem o compromisso de trabalhar junto aos cipeiros e proteger a categoria dentro das empresas. Por isso, é fundamental estarmos na mesma página”, afirma.
“O Sindicato atua constantemente pra evitar o problema, fiscalizando as empresas, cobrando adequações no local de trabalho e buscando fortalecer as CIPAS”, completa Leandro Soares.