Especialistas e ativistas que defendem a descriminalização das drogas no Brasil vão entregar uma carta à presidenta Dilma Rousseff, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF) cobrando a elaboração de uma nova política antidrogas que não seja baseada em medidas proibicionistas. A principal crítica do grupo é ao Projeto de Lei 7.663, de 2010, do deputado Osmar Terra (PMDB-RS), que altera a Lei Antidrogas para aumentar a pena mínima para traficantes de drogas e prevê a internação compulsória de dependentes. Segundo os signatários do documento, o PL é um retrocesso no debate sobre drogas no Brasil e fere direitos constitucionais.
“Constatamos a falência do modelo proibicionista, nos preocupa que o PL do Osmar Terra aponte na direção contrária, em particular, priorizando a internação forçada, que a própria ONU declara como sendo tortura. Consideramos inadmissível que o governo da presidenta Dilma, que tem um histórico de defesa dos direitos humanos, admita que isso venha a ocorrer”, avaliou o neurocientista Sidarta Ribeiro, integrante da comissão científica e organizadora do congresso.
O governo federal elabora uma proposta alternativa à de Osmar Terra, que pode ser submetida ao plenário da Câmara esta semana. “A internação involuntária é o fracasso da clínica no campo da saúde mental. Qualquer psiquiatra que faz uma internação involuntária o faz através do fracasso da sua capacidade de cuidar. Ela ocorre quando nada mais deu certo. Não podemos ter uma política pública baseada no fracasso”, disse à Agência Brasil o coordenador adjunto de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Léon Garcia.
Ao STF, o documento pede o julgamento da inconstitucionalidade da penalização do porte de drogas para uso pessoal, prevista no Artigo 28 da Lei Antidrogas. Atualmente, a legislação determina que a diferenciação seja feita de acordo com aspectos subjetivos, o que acaba abrindo brechas. Os especialistas criticam a ausência de parâmetros que norteiem uma diferenciação objetiva entre usuários e traficantes, o que acaba levando ao maior encarceramento de usuários e à superlotação de presídios.
“Desde 2006 [quando entrou em vigor a atual Lei Antidrogas], muitos usuários têm sido presos como traficantes. Aumentou o número de pessoas presas como traficantes, sendo que a lei objetiva o oposto. Como essa legislação não prevê que o uso seja penalizado com detenção, os usuários têm sido automaticamente classificados como traficantes. Há o hiperencarceramento de pessoas não violentas no Brasil”, disse o organizador do congresso e professor da Universidade de Brasília, Renato Malcher.
Para Ribeiro, o debate antidrogas no Brasil tem sido “rebaixado” pela falta de argumentos dos defensores de medidas que apenas preconizam a proibição. Além disso, é preciso garantir informação para que a sociedade possa se manifestar sobre o assunto. “A única maneira de proteger a sociedade é com informação, isso só se consegue com regulamentação, com transparência. Na obscuridade da proibição isso é impossível”, ponderou. “O proibicionismo fracassou, aumentou a violência. Não há justificativa para proibição, é tudo baseado em falácia.
Eles não têm argumentos, mas têm a anuência dos desinformados”, criticou.
O congresso reuniu cerca de 700 participantes, entre membros de movimentos da sociedade civil, de universidades e representantes do governo, em sua maioria contrários às internações e à criminalização do uso das drogas.