Quando Edina Aparecida da Silva, 40, concedeu uma entrevista ao Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal), em março de 2021, ela era uma das 18 mulheres que operavam uma empilhadeira nas 14 cidades da base do Sindicato. Dois anos depois, ela continua sendo uma entre 18. Dados levantados pela subseção do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostram que essa permanece sendo a quantidade de mulheres na função.
“Eu mesmo só conheço três empilhaderistas”, comenta a metalúrgica. Para Edina, em dois anos algumas coisas mudaram. Ela afirma que percebe mais mulheres em cargos de liderança, no entanto acredita que falta espaço. “Nós ainda somos vistas como ‘sexo frágil’, necessitamos de mais oportunidades no mercado de trabalho”, analisa.
Entre suas responsabilidades de trabalho estão carregar e descarregar, preparar caixas de materiais, transportar peças nos racks para abastecer as linhas de produção da Kanjiko do Brasil e também auxiliar na organização do local de trabalho. Funções que demandam tanto a força física, quanto conhecimento dos processos e especialização.
Assim como Edina, outras também desafiam a máxima de que há “trabalho de homem” e “trabalho de mulher”. A metalúrgica Camila Cristina (primeira na foto de destaque da matéria), 36, munida de protetor auricular, capacete, mangote, avental e luvas, realiza soldagem de parafusos e porcas, na produção desta mesma fábrica. Ela é uma das poucas mulheres dentro do processo de solda.
“Entrar em um setor onde trabalham 99% de homens é um desafio. Temos que mostrar diariamente que somos capazes de exercer a mesma função, que estamos aptas para qualquer trabalho com muita garra e força de vontade para conseguirmos nosso espaço”, comenta Camila.
Dados
A quantidade de metalúrgicas também mudou desde a última vez que Edina falou à Imprensa SMetal. Hoje são 8 mil mulheres, em um montante total de 42 mil trabalhadores, o que representa uma fatia de 19,29% da categoria na base do SMetal. A reportagem da Folha Metalúrgica desta semana destacou outro importante dado: são 707 ocupações na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), feita pelo Ministério do Trabalho. Em 356 postos não há mulheres contratadas.
Desafiando as estatísticas
A primeira mulher a trabalhar na fundição da empresa Ibrafer se chama Eliane dos Santos e tem 40 anos. Quando recebeu o contato para uma entrevista com o setor de Recursos Humanos de uma fábrica predominantemente masculina, não se assustou.
“Para mim foi tranquilo. Acho que a mulher é capaz de fazer os mesmos serviços, apesar de ter uma limitação física para determinadas coisas, somos capazes de manusear pontes rolantes [mecanismo dentro da produção], conduzir um carrinho e outros processos. É preciso ter muita atenção e cuidado”, explica sobre seu trabalho.
A metalúrgica tem no currículo o curso de operadora de ponte rolante, metrologia, interpretação de desenho e operadora de empilhadeira. Na sua visão, ter qualificação pode ser o diferencial na hora da contratação. “Sempre falo para minhas amigas irem atrás desses cursos porque a maioria das empresas solicita. Estou sempre incentivando”, relata.
Muitas vezes mesmo as mulheres com formação ficam de fora do mercado de trabalho. É o caso da motorista de veículos industriais, Camila Abieiro Silva, que dirigia caminhões em empresa metalúrgica. No cotidiano da fábrica, a maioria das rotas eram destinadas para as mulheres, segundo ela. “Além de ser rápido, tinha que tomar cuidado porque as peças poderiam cair fácil”, recorda. Outra questão que pontua é que o índice de queda de material era menor com as mulheres na condução dos veículos.
No final de 2022, foi desligada de sua função e começou um curso de transporte coletivo, escolar e de emergência. O objetivo futuro é ser motorista de ônibus na cidade, mas a oportunidade ainda não chegou. É importante salientar que ela tem sete anos de experiência na direção de caminhões, além de qualificação.
Abrir as portas
Quando há vagas e candidaturas qualificadas, o que falta é abrir as portas. Suelen Araújo, 37, é coordenadora de gente e gestão da Ibrafer, empresa que trabalha com a fabricação de AMV’s para linhas férreas, agulha/jacaré e contra-trilhos, além de outros acessórios neste ramo. O trabalho pode ser complexo e, até oito meses atrás, nenhuma mulher atuava na produção. Foi com a atuação das lideranças que este cenário mudou.
Suelen diz que apenas observar a produção e caracteriza-la como pesada, sem pensar em soluções, seria o caminho mais fácil a se tomar. “Eu poderia entrar aqui um dia, olhar para a fábrica e pensar que é pesado, não tem como e pronto. Não! A gente decidiu olhar com outro olhar. É pesado, mas será que aqui não poderíamos ter uma mulher? O olhar tem que ser esse. As pessoas sempre acreditaram que não dava e agora provamos que tem como”, diz.
O resultado dessa visão é positivo. Uma mulher recolocada no mercado de trabalho e exercendo suas funções com facilidade. “Fui muito acolhida quando cheguei na empresa e não tive grandes dificuldades para entender o processo. Acredito que é possível colocar as mulheres na produção. Somos capazes”, afirma a metalúrgica Eliane dos Santos, contratada na Ibrafer.
“A ideia, daqui para frente, é quanto mais a gente conseguir automatizar nossos processos, mais mulheres estejam na empresa. Dentro do que pode ser incorporada a participação das meninas, faremos o possível para que elas tenham igualdade na hora de estar nos processos. Pelo menos isso: uma oportunidade de estar e ser considerada para os cargos”, pondera Suelen.