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Se precisar, peça ajuda

Conheça os fatores de risco psicossociais no trabalho que podem te adoecer; categoria relata descaso

Neste Dia de Prevenção ao Suicídio, metalúrgicos relatam sofrer pressão e descaso por parte de gestores

Gabriela Guedes/Imprensa SMetal
Freepik/Gerado por Inteligência Artificial

Segundo dados da Previdência Social, transtornos mentais são a terceira principal causa de afastamentos por auxílio-doença.

Esta terça-feira, 10, marca o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, definido pela Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio (IASP) e endossado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A data é uma oportunidade para refletir sobre formas de prevenção desta tragédia que, segundo as entidades, atinge 38 pessoas por dia no Brasil, em média. 

No trabalho, o estresse, a pressão por resultados, jornadas excessivas e a falta de reconhecimento são fatores que contribuem para o esgotamento mental, um problema que pode levar ao desenvolvimento de transtornos mentais, incluindo a depressão, ansiedade e, em casos extremos, ao suicídio. 

Segundo dados da Previdência Social, transtornos mentais são a terceira principal causa de afastamentos por auxílio-doença. O vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal) e secretário de saúde do trabalhador da Central Única dos Trabalhadores (CUT-SP), Valdeci Henrique da Silva (Verdinho), ressalta que essa discussão tem sido travada com prioridade pelo Sindicato e pela Central.

“Nosso objetivo é trabalhar com a conscientização, inclusive com as áreas de Recursos Humanos, exigindo que dêem maior atenção a essa questão. A maioria de nós passa mais tempo no trabalho do que em casa e o assédio moral, sexual, a pressão podem adoecer os trabalhadores a ponto de fazê-los atentar contra a própria vida”. Ainda, o vice-presidente faz um apelo para que essa questão seja encarada de forma séria e eficaz.

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Fatores de Risco

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), os Fatores de Riscos Psicossociais no Trabalho (FRPT) são aqueles que podem contribuir para o estresse, adoecimento físico e mental dos trabalhadores como, por exemplo, insegurança na execução de atividades, desinformação operacional, descumprimento de prazos, definição de metas inalcançáveis, inflexibilidade no ambiente de trabalho, exigências contraditórias, jornadas de trabalho excessivas, horas extras não pagas, situações de estresse, pressão por resultados impossíveis de se atingir, entre outros.

O assessor da Presidência da Fundacentro e médico psiquiatra, Marcelo Kimati Dias, em entrevista para o SMetal, reforça que as boas condições no ambiente de trabalho devem ser acompanhadas de boas condições estruturais. Isto é, não basta ter um ambiente climatizado, se o trabalhador ganha mal, por exemplo. 

“Proteger a saúde mental em ambiente de trabalho é combater um modelo de produção baseado na alienação das práticas cotidianas, com a repetição de processos que não fazem sentido ao sujeito e da fragmentação do processo de trabalho. Este modelo, empregado desde o início do século passado em indústrias, expropria do sujeito alguns elementos essenciais no trabalho: o desenvolvimento de práticas coletivas e o sentido necessário ao que se faz”, disse.

Marcelo relata, também, que quadros de depressão e ansiedade são transtornos muito comuns, chegando até a 30% em alguns estudos populacionais.

O que dizem os trabalhadores

O metalúrgico Vinícius*, conta que precisou se afastar do trabalho entre 2019 e 2021, sem receber seu salário, devido à síndrome do pânico que desenvolveu por conta da sobrecarga de trabalho e responsabilidades, o que o obriga a fazer acompanhamento psicológico, psiquiátrico e tomar remédios constantemente há quase cinco anos. Ele precisou vender seu carro para se sustentar ao longo de seu afastamento, pois não recebeu apoio da fábrica. Porém, precisou voltar ao trabalho e segue na mesma empresa ainda hoje.

Ele relata que seus gestores lhe prometeram que seria promovido após ser ‘emprestado’ para outro setor. Porém, acabou nunca voltando ao seu posto original. Após essa situação, passou a ter reações quando ia ao trabalho, com calafrios, boca seca, sudorese. Chegava a passar mal só de ouvir o ônibus fretado chegando para buscá-lo. 

“Até hoje aguento chacotas por conta disso, mas todo mundo sabe que foi na empresa que desenvolvi esses problemas. Foi devido a mudança da rotina que desenvolvi tudo isso. Eu não me vejo bem ainda, sigo fazendo tratamento. Toda segunda-feira estou sempre muito deprimido e até hoje não mudaram o meu cargo”, afirma o trabalhador.

Para Renata*, trabalhadora metalúrgica, a campanha Setembro Amarelo deveria ser levada mais a sério. Ela conta que seus gestores são engajados, mas não respeitam os trabalhadores, que acabam adoecendo. Ela própria desenvolveu ansiedade e síndrome do pânico no trabalho. “Eu me sentia culpada de buscar me curar e tinha medo de perder meu emprego”, disse a metalúrgica.

A advogada do Departamento Jurídico do SMetal, Márcia Jeunon, explica que, infelizmente, casos como este são muito comuns e é possível buscar ajuda jurídica, além de médica. 

O Sindicato disponibiliza assessoria para a categoria e, para agendar um atendimento, basta entrar em contato por meio do Whatsapp (15) 997149534.

O que diz a ciência

Segundo o artigo científico ‘Risco de suicídio no trabalho: revisão integrativa sobre fatores psicossociais’, de Barbara Vieira, Marcia Bandini, Valmir Azevedo e Sergio Luccal, publicado na revista Saúde em Debate, da Unicamp, o suicídio é compreendido como um evento multifatorial, decorrente de uma complexa interação entre fatores individuais, sociais e ambientais. 

Os pesquisadores apontam que, no mundo do trabalho contemporâneo, os trabalhadores vivenciam ou são submetidos a permanente rivalidade, com estímulo à competição e avaliações de desempenho centradas na produtividade individual, bloqueando as estratégias coletivas de defesa e as redes de solidariedade, dando lugar ao isolamento, à depressão, ao suicídio e ao silêncio dos pares. 

A pesquisa reforça que práticas de gestão assediadoras nas organizações e outros fatores psicossociais no trabalho podem desencadear sofrimento e atuar como preditores de transtornos mentais e risco de suicídio.

Mecanismos de regulação

Recentemente, o Ministério da Saúde incluiu as condições laborais em suas estratégias de vigilância e prevenção do suicídio. Em agosto de 2020, a atualização da ‘Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho’ reconheceu as lesões autoprovocadas intencionalmente como potencialmente relacionadas ao trabalho e incluiu os fatores  psicossociais  e  da  organização  do trabalho como condições laborais de risco para o suicídio.

Já em novembro de 2023, o Ministério incluiu mais 165 novas patologias, incluindo doenças como o a Síndrome do Burnout, ansiedade, o abuso de drogas e tentativas de suicídio, garantindo com que os trabalhadores possam ter garantidos os direitos a assistência, tratamento e afastamento do trabalho em decorrência dessas patologias quando comprovado o nexo causal

Prevenção

O suicídio é um fenômeno complexo, multifacetado e de múltiplas determinações, que pode afetar indivíduos de diferentes origens, classes sociais, idades, orientações sexuais e identidades de gênero e pode ser prevenido. Saber reconhecer os sinais de alerta em si mesmo ou em alguém próximo pode ser o primeiro e mais importante passo. 

Os sinais de alerta não devem ser considerados isoladamente. Não há uma “receita” para detectar seguramente quando uma pessoa está vivenciando uma crise suicida, nem se tem algum tipo de tendência suicida. Entretanto, um indivíduo em sofrimento pode dar certos sinais, que devem chamar a atenção de seus familiares e amigos próximos, sobretudo se muitos desses sinais se manifestam ao mesmo tempo.

O aparecimento ou agravamento de problemas de conduta ou de manifestações verbais durante pelo menos duas semanas, preocupação com sua própria morte ou falta de esperança, expressão de ideias ou de intenções suicidas e isolamento podem ser alguns sinais.

Onde buscar ajuda

  • CAPS e Unidades Básicas de Saúde (Saúde da família, Postos e Centros de Saúde);
  • UPA 24H, SAMU 192, Pronto Socorro; Hospitais;
  • Centro de Valorização da Vida – 188 (ligação gratuita).
  • SMetal (Rua Julio Hanser, 140, Lageado)

Setembro amarelo

Com o lema ‘Se precisar, peça ajuda’, a Setembro Amarelo é uma campanha para a conscientização e prevenção do suicídio, e sua relevância no mundo do trabalho é cada vez mais reconhecida. Este mês tem como objetivo romper o silêncio em torno do suicídio, promovendo diálogos abertos sobre saúde mental e incentivando a busca por ajuda. 

Embora o foco não se destine especificamente aos trabalhadores, o ambiente de trabalho ganha especial importância devido ao impacto significativo que a organização do trabalho pode ter na saúde mental. 

É importante ressaltar que a campanha alerta sobre esses riscos, promove o bem-estar e incentiva a cultura organizacional que valoriza a saúde mental. Ao abordar o suicídio de forma aberta, as empresas podem contribuir para a diminuição do estigma, criar um ambiente seguro para que os trabalhadores se sintam à vontade para compartilhar suas dificuldades e buscar auxílio. 

O dia 10 de setembro é a data oficial do Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, mas o tema deve ser tratado durante todo o ano. 

*Com informações da Fundacentro, Ministério da Saúde

*Os nomes dos trabalhadores são fictícios

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