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Direitos Humanos

Comissão verifica processo de fechamento dos hospitais psiquiátricos

Objetivo do grupo foi acompanhar o andamento de um acordo, que prevê o fechamento desses hospitais em, no máximo, três anos

Imprensa SMetal
Foguinho/Imprensa SMetal

A série de visitas surpresas foi acompanhada pelo Ministério Público começou às 9h no Hospital de Saúde Mental

Dentro do prazo de três anos, os sete hospitais psiquiátricos particulares instalados em Sorocaba, Piedade e Salto de Pirapora devem ser fechados e todos os cerca de três mil pacientes hoje internados nessas instituições terão de ser transferidos para residências terapêuticas ou Centros de Atendimento Psicossocial (Caps).

É o que prevê um termo de ajustamento de conduta (TAC) assinado no final de 2012 pelas três prefeituras, governo estadual, governo federal e o Ministério Público Estadual e Ministério Público Federal. O TAC também reafirma o que já determina a lei federal 10.216, de 2001, conhecida como política antimanicomial.

Para discutir o andamento do TAC, uma audiência pública presidida pelo vereador Izídio de Brito (PT) foi realizada com representantes de todos os órgãos e instâncias envolvidas na tarde desta segunda-feira, dia 2, na Câmara Municipal.

Pela manhã, para verificar se os termos do TAC estão sendo cumpridos, deputados que integram o Grupo de Trabalho de Saúde Mental da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara Federal realizaram visitas surpresas em três hospitais psiquiátricos de Sorocaba: Hospital Mental, Vera Cruz e Jardim das Acácias.

Além da deputada federal Erika Kokay (PT-DF) e do deputado federal Jefferson Campos (PSD-SP), membros da Comissão de Seguridade Social da Câmara, a deputada federal Iara Bernardi e os vereadores que integram a Comissão de Saúde da Câmara Municipal de Sorocaba também acompanharam a visita.

Também participaram das diligências nas instituições psiquiátricas da cidade representantes do Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, Secretaria Municipal de Saúde, Secretaria Estadual de Saúde, Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços de Saúde (Sinsaúde), Ministério da Saúde e Secretaria Especial de Direitos Humanos ligado à Presidência da República.

“O que precisamos é romper com essa lógica manicomial, que é negar a condição de pessoa. mas existe uma concepção, histórica, que é a lógica manicomial e precisa se adequar aos termos de ajustamento de conduta que foram propostos. Essa lógica asilar, que vai contra o que prevê a reforma psiquiátrica, é inadimissível”, afirmou a deputada Erika.

A série de visitas surpresas foi acompanhada pela imprensa local e começou às 9h no Hospital de Saúde Mental.

De acordo com David Haddad, diretor do Hospital Mental, hoje a instituição tem 238 internas, mas em março desse ano o número era de 363. “As pacientes que tinham condições de saírem daqui já saíram”, afirma.

O responsável pelo hospital, que atende apenas mulheres, admitiu aos deputados que a instituição enfrenta dificuldades financeiras e o número de funcionários está abaixo do ideal. “Um estudo da Fundação Getúlio Vargas aponta que o repasse mínimo necessário para manter um hospital psiquiátrico em boas condições seria de R$ 180 por dia para cada paciente enquanto que hoje o governo federal envia 42,37”, justificou.

“Situação maquiada”

Em seguida, às 10h30, o grupo de trabalho visitou o Hospital Vera Cruz. Em janeiro deste ano, o hospital particular sofreu intervenção da prefeitura de Sorocaba.

As condições da unidade, observadas nesta segunda-feira, foram bem diferentes das constatadas pelos vereadores da Comissão de Saúde de Sorocaba em vistoria surpresa realizadas há 25 dias. (veja aqui). Na ocasião, a visita dos parlamentares, que também foi acompanhada pela Imprensa SMetal, constatou uma série de situações precárias nas instalações da unidade como fiação elétrica exposta, vasos sanitários entupidos e falta de iluminação.

“Uma pessoa que trabalha aqui me contou hoje mesmo que normalmente a situação não é assim. Geralmente os locais não estão tão limpos como hoje e os internos vivem descalços e, muitas vezes, sem roupas. É uma situação que está maquiada”, afirmou Milton Sanches, presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços de Saúde (Sinsaúde).

O vereador Izídio de Brito, atual presidente da Comissão de Saúde e que em 2011 presidiu uma Comissão Especial para investigar o atendimento nos hospitais psiquiátricos da cidade, disse acreditar na possibilidade de os hospitais terem se informado sobre as visitas a tempo de fazerem adequações.

“A visita de hoje foi debatida anteriormente no Congresso Nacional, portanto creio que os hospitais da região já estavam sabendo. Então eu observei que eles deram uma ajeitada geral para passar uma boa impressão nessa visita, mas os problemas cruciais continuam como a falta de investimento e a resistência na desinternação, que é o que a lei 10.216 defende”, apontou.

De acordo com o gestor administrativo do Vera Cruz, Agenor Cheutchuk, desde que o hospital sofreu intervenção da prefeitura, 50 pacientes tiveram alta e hoje vivem em residências terapêuticas. “Ainda temos 350 internos”, admitiu.

Segundo Agenor, a Prefeitura de Sorocaba deverá anunciar nos próximos dias o nome de uma Organização Social (OS) que ficará responsável pela administração do Vera Cruz.

Por fim, os integrantes do grupo de trabalho da Câmara Federal, juntamente com os vereadores e representantes do Ministério Público Federal e Estadual visitaram o hospital Jardim das Acácias, no Jd. Novo Mundo.

Atualmente esse hospital tem 105 pacientes internados, mas o número, segundo o diretor da entidade, já foi superior a 400. “Hoje nós prestamos atendimento multidisciplinar para 70 pessoas com transtornos psiquiátricos que moram em doze residências terapêuticas, em casas nos bairros de Sorocaba. Além daquelas que são atendidas em quatro Centros de Atendimento Psicossocial (Caps)”, detalha o diretor José Carlos Milan.

Audiência pública defende fim do confinamento

À tarde, a audiência pública realizada na Câmara Municipal de Sorocaba, proposta pelo vereador Izídio de Brito, contou com a presença dos responsáveis pela elaboração do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) tripartite assinado no final de 2012. Na ocasião, praticamente todos os integrantes defenderam o fim do confinamento de pacientes com transtornos mentais.

“O paradigma deste TAC é a construção de um novo modelo de atendimento psiquiátrico, não mais asilar. Ele prevê a construção de uma rede de atenção psicossocial a essas pessoas que têm o direito de viver na comunidade e ter sua dignidade e autonomia”, defendeu o promotor de Justiça Roberto Campos de Andrade.

Para Lúcio Costa, representante da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, o TAC assinado pelos municípios de Sorocaba, Salto de Pirapora e Piedade, e os governos estadual e federal junto ao Ministério Público, demonstra que a política antimanicomial na região está “no caminho certo”. “O conceito está no rumo correto. E esse conceito é o que move uma busca diária de rompimento com a lógica do confinamento desumano, que durante anos foi praticada e naturalizada na nossa região”, comentou.

Representando a Secretaria Estadual de Saúde, Mircei Elizabeth Deloz acrescentou que o modelo de internação de pessoas com transtornos psiquiátricos é um modelo ultrapassado. “Hospital não é lugar para se morar. Essa segregação não é justa”, acrescentou.

Izídio de Brito, que presidiu a audiência pública, elogiou os esforços de todos os envolvidos no cumprimento do TAC, mas cobrou da prefeitura de Sorocaba mais agilidade, para a construção de uma rede, capaz de atender os pacientes que ainda estão internados nos hospitais psiquiátricos da cidade. “É preciso criar a rede [de atenção psicossocial] e, ao mesmo tempo, não entrar na lógica da terceirização, que é simplesmente transferir a responsabilidade para as organizações sociais”, completou.

Em audiência presidida pelo vereador Izídio de Brito (PT), praticamente todos os participantes defenderam o fim da internação de pessoas com transtornos mentais (Foguinho/Imprensa SMetal)

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