A história do programa Bolsa Família se confunde com a história recente do país, quando há 20 anos, em outubro de 2003, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, então em seu primeiro mandato, reformulou e turbinou programas sociais para que atendessem, de fato, às populações mais vulneráveis.
O Programa foi uma das marcas de Lula no combate à fome, à pobreza e à desigualdade. Fazia parte de um conjunto de medidas voltadas a reverter cicatrizes históricas do país relacionadas à exclusão social. O Bolsa Família, que reuniu num só benefício o Bolsa Escola, Vale Gás, Bolsa Alimentação e Cartão Alimentação, do governo de FHC, era o carro chefe do Fome Zero, uma das primeiras ações de Lula como presidente.
“É um programa importantíssimo na linha do que ainda precisa ser feito que é o direito a uma renda mínima a todo cidadão brasileiro. E tem uma grande relevância no combate à pobreza principalmente entre as mulheres e crianças, porque o programa, como foi pensado, as ampara diretamente”, diz a secretária de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara.
A dirigente ressalta que a iniciativa vai de encontro aos princípios básicos defendidos pela CUT, desde a sua fundação, que incluem a promoção e defesa de justiça econômica e social no país.
“Em 2002, assim como no ano passado, a CUT apoiou a candidatura de um governo democrático e popular cujo objetivo era justamente esse, o de amparar as populações mais vulneráveis. Portanto programas sociais como o Bolsa Família são essenciais para que a sociedade seja menos desigual e que todos tenham acesso a uma renda mínima”.
Ela reforça que a CUT ainda defende a ampliação do programa e a criação e um programa voltado a uma renda mínima para todos os brasileiros. “E isso não se significa, em absoluto, que o programa se contraponha à geração de emprego e renda para todos, o que também é defesa da CUT”, ela ressalta.
Ao longo dos tempos, os setores elitistas e conservadores da sociedade argumentam que o programa criaria ‘vagabundos’, que não trabalhariam para receber o benefício, que à época da criação era de R$ 50 reais, além de ‘mulheres que engravidariam apenas para receber os benefícios”, entre outras tantas mentiras. Números levantados por vários estudos e a própria história mostraram os impactos positivos para as populações mais carentes.
Esses estudos realizados no Brasil e no mundo comprovaram que o programa deu um novo horizonte, mudou a trajetória de muitas vidas no país, diz o consultor da Action Aid, organização não governamental de combate à desigualdade social, e ex-presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Francisco Menezes.
“O Programa Bolsa família teve um papel junto com outros programas e medidas executadas, em um determinado momento da vida brasileira, de enorme efetividade no enfrentamento da pobreza e da desigualdade”, ele afirma.
Entre os êxitos do programa, citados pelo consultor, estão a transferência de uma renda essencial para garantia de direitos mínimos, como é a questão da alimentação, da habitação e da mobilidade, além de outras necessidades materiais, a disposição e possibilidade de trabalhadoras e trabalhadores não aceitarem mais remunerações absolutamente rebaixadas diante do que lhes era exigido como força de trabalho e a elevação da autoestima dos mais vulneráveis, com destaque para mulheres negras que formam a maioria das titulares do programa.
Estudos comprovam os benefícios do Bolsa Família
Um dos levantamentos acompanhou 360 mil crianças de 2008 a 2012. Entre os resultados constatou-se que houve uma redução no déficit de estatura em média de 17,5% dessas crianças, de zero a 5 anos, que até 2008 era menor do que média das demais. Já em 2012, verificou-se que o índice caiu para metade entre essas mesmas crianças, já com idade entre 5 e 9 anos.
Outro estudo publicado pela revista The Lancet, publicação científica sobre medicina do Reino Unido, mostrou a redução na mortalidade infantil como efeito do programa. Uma das mais fortes evidências sobre a importância do Programa Bolsa Família está nos estudos sobre a expressiva redução da mortalidade infantil entre as crianças de famílias beneficiárias, em especial quando associados o Bolsa Família e ao Programa de Saúde da Família. A mortalidade infantil causada por diarreia recuou em 46% e a causada por desnutrição em 58%”, afirmou a ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, em entrevista a Carta Capital.
Promovendo um futuro melhor: o Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS), também fez diversos estudos avaliando a permanência dos filhos de beneficiários do Bolsa Família. Os dados mostraram que 64% dos dependentes de beneficiários de 7 a 16 anos em 2005 já haviam deixado o Cadastro Único (CadÚnico) em 2019, quando a faixa de idade dessas pessoas já estava entre 21 e 30 anos.
Dos que permaneceram no cadastro, somente, 20% recebiam o Bolsa Família no início da vida adulta. Outros 14% estavam cadastrados, mas não recebiam o benefício, o que indica que já estavam acima da linha de pobreza.
“A taxa de saída do Cadastro Único nos leva a entender que as condicionalidades do programa surtiram efeito, ou seja, a manutenção da criança na escola e os cuidados com sua saúde permitiram que essas crianças acumulassem capital humano que lhes garantisse um emprego formal que lhes tirasse da pobreza, embora um choque como a pandemia possa jogá-los novamente nessa condição”, disse Paulo Tafner, diretor-presidente do IMDS à BBC.
Reconhecimento mundial
“Uma experiência importante que contém lições a outros países sobre políticas de redução da desigualdade social”. Foi desta forma que, em 2014, o Banco Mundial, entidade ligada à Organização das Nações Unidas (ONU) se pronunciou sobre o Bolsa Família, quando o programa estava preste a completar 10 anos.
“Montar um sistema de proteção social não é apenas algo que pode ser feito, mas que deve ser feito e que é possível”, disse o então diretor de Proteção Social da entidade , Arup Banerji, citando ressaltando o caráter de ‘foco das ações nas famílias”, ou seja, priorizar brasileiros de baixa renda nas políticas de Estado.
O programa foi ainda reconhecido diversas vezes por entidades internacionais. Um ano antes do reconhecimento do Banco Mundial, a ex-ministra Tereza Campello, havia recebido, em Doha, no Catar, o I Prêmio por Desempenho Extraordinário em Seguridade Social, concedido ao Bolsa Família pela Associação Internacional de Seguridade Social (ISSA, na sigla em inglês).