Em 2016, Alan de Campos Alves colocava os pés na metalúrgica Clarios pela primeira vez. À época, tinha acabado de chegar à maioridade e passava pela experiência do primeiro emprego sendo que, foi pela Lei de Aprendizagem (nº 10.097/2000), que ele pôde atuar como jovem aprendiz por 11 meses antes de ser efetivado como operador de produção na metalúrgica. Para ele, poder estar dentro de uma empresa de grande porte é um privilégio. “Não são todos os jovens que conseguem essa oportunidade na área do trabalho, ainda mais agora com o momento que passamos que não é dos melhores”, diz.
De fato. O mesmo Brasil que tem jovens como Alan, também é terra de garotos e garotas como os participantes do “Breque dos Apps”, um movimento de paralisação que, desde o ano passado, pede direitos aos entregadores de aplicativos de delivery. No meio da pandemia do coronavírus, os trabalhadores de aplicativo se viram explorados e sem direitos. Desta forma, duas grandes paralisações foram registradas na capital paulista e, também, em municípios de outros estados. Por conta de o índice de desemprego entre os jovens estar em um patamar alto (atingindo quase 30%) esse tipo de atuação reúne diversos trabalhadores nesta faixa etária. São, de fato, dos Brasis. Duas juventudes.
Neste sábado, dia 24, se comemora o Dia do Jovem Trabalhador, data instituída para discutir a participação da juventude no mercado de trabalho. O Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal) conversou com Alan e Bruna, dois jovens que atuam na indústria metalúrgica na cidade e repercutiu, ainda, a questão do trabalho informal.
Contrariando a ideia que muitas vezes é propagada, de que a juventude é “preguiçosa”, Alan, de 23 anos, realiza um trabalho árduo. Dentre as suas funções, faz operações gerais, limpa e regula máquinas, realiza o processo de ‘setup’ (troca de produto), faz ordem de produção na parte elétrica, mecânica ou ferramental das máquinas, além de realizar a logística desses produtos para o estoque da empresa.
Bruna Guerrero de Souza, 21, é auxiliar administrativa na Kanjiko do Brasil. Assim como o metalúrgico da Clarios, ela começou sua carreira como jovem aprendiz e depois foi efetivada na empresa que trabalha há dois anos. Em sua concepção, existe procura por jovens, mas as exigências são grandes. “A busca por mão de obra existe, mas pedem muita capacitação para os jovens. A oportunidade, além de difícil acesso, requer experiência. O que é até contraditório”, comenta.
A questão da experiência é um dos entraves que a faixa etária se depara ao procurar a primeira oportunidade. No caso dos metalúrgicos, a Convenção Coletiva da categoria prevê (e incentiva) que as empresas façam contratações de jovens de 18 a 23 anos para o primeiro emprego, capacitando e criando um ambiente favorável para o aprendizado desse trabalhador.
Hoje, a função de Bruna é cuidar de questões relacionadas ao apontamento de produção. Ela cria ‘kanbans’ – uma ferramenta usada para acompanhar o andamento dos fluxos de produção – além de analisar o estoque físico da Kanjiko e operar outras funções no sistema. “O que eu mais gosto do meu trabalho são os conhecimentos adquiridos durante o dia a dia”, comenta.
Não é atoa que o programa de aprendizagem é uma das principais vias pelas quais jovens ingressam no mercado de trabalho e podem, no futuro, serem efetivados, como aconteceu com Alan e Bruna. De acordo com dados do Caged, organizados pelo Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), entre janeiro e fevereiro deste ano, o estado de São Paulo registrou a contração de 23.950 aprendizes. Em Sorocaba, foram 747 aprendizes contratados. O CIEE administra um total de 1300 contratos de jovens aprendizes na região metropolitana de Sorocaba e, deste montante, ao menos 36% desses trabalhadores estão atuando na indústria.
Os entrevistados afirmam que o trabalho que desempenham hoje será importante no futuro. “Eu acho que isso será muito impactante até porque eu passei meus primeiros aprendizados profissionais nessa parte da produção. Como foi meu primeiro emprego, tudo pra mim era novo, aprendi muita coisa”, diz Alan. “A Kanjiko foi e está sendo um aprendizado grande na minha vida. Cada dia é como se fosse um novo desafio e espero crescer profissionalmente”, finaliza Bruna.
Convenção Coletiva assegura direitos a jovens trabalhadores
Nesta semana, no especial DNA Metalúrgico, o Sindicato dos Metalúrgicos mostrou um pouco mais sobre o perfil dos trabalhadores do segmento. Entre as informações, os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), organizados pela subseção do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) dos Metalúrgicos de Sorocaba mostram que, dos 37 mil metalúrgicos que compõem a base do SMetal, 25,46% são jovens
É importante ressaltar que a Convenção Coletiva dos Metalúrgicos assegura diversos direitos para a juventude trabalhadora. Como já foi mencionado acima, existe o incentivo na contração de jovens de 18 a 23 anos. Além disso, caso o trabalhador empregado esteja estudando poderá optar por trabalhar em turno fixo, diferente do horário dos estudos, mediante comprovação.
A possibilidade de sair mais cedo para realizar provas e exames também existe e assegura que o trabalhador tenha tranquilidade para cumprir os compromissos estudantis.
Uberização
A Sorocaba (e o Brasil) que separa Alan e Bruna de outros jovens é abismal. A desigualdade social e a falta de oportunidades formais fazem com que a juventude esteja dividida entre os que possuem oportunidades e aqueles que precisam recorrer a trabalhos informais como, por exemplo, a entrega de produtos por aplicativos de delivery.
O desemprego e a necessidade são outros fatores. Somente em 2020, a taxa de desemprego entre os trabalhadores de 18 a 24 anos era de 29,8%, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Na visão da secretária de juventude da CUT-SP, Priscila dos Passos Silva, o que falta para os trabalhadores jovens são empregos com carteira assinada. “Hoje, com a questão da uberização, há muitos jovens inseridos no trabalho informal – em que eles não têm direitos trabalhistas ou uma categoria que os represente”, analisa.
A palavra “uberização”, usada por Priscila, é um termo criado para definir uma modalidade de atuação focada no compartilhamento e no trabalho por demanda, como no próprio aplicativo de caronas Uber. Hoje, sociólogos e especialistas já utilizam a palavra para se referir à precarização vivenciada por muitos entregadores e motoristas de aplicativos.
“Vemos o trabalho com os aplicativos como uma saída colocada pela necessidade. O jovem também precisa comer e vestir e, diante dos números do desemprego, muitos acabam recorrendo a este tipo de atuação que é digna como todas as outras, mas deixa o trabalhador desassistido. Se algo acontecer, os aplicativos não se responsabilizam pela vida e saúde daquele jovem”, afirma o presidente do SMetal, Leandro Soares.
Na visão de Leandro e Priscila, é necessário continuar atuando para que as empresas invistam na criação de novos postos de trabalho e, desta forma, possam empregar a juventude. “Precisamos observar a questão e pautar as empresas para que elas contratem essas pessoas dentro da formalidade”, finaliza a secretária de juventude da CUT-SP.