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Tsunami da Educação

Cortes da Educação despertam as ruas contra Bolsonaro

Milhares de pessoas foram às ruas para protestar em 26 Estados, nos primeiros grandes protestos nacionais contra o presidente. Dos EUA, mandatário chamou manifestantes de "idiotas úteis"

El País
NELSON ALMEIDA (AFP)
Protesto na av. Paulista contra os cortes na Educação

Protesto na av. Paulista contra os cortes na Educação

As ruas despertaram contra Jair Bolsonaro. Os cortes no Ministério da Educação somados à retórica belicosa do Governo contra as universidades, consideradas antros “esquerdistas”, levaram milhares de pessoas a marchar pelas capitais e médias cidades espalhadas por 26 Estados. Foi o primeiro protesto nacional contra o presidente de extrema direita que está há quatro meses e meio no poder. A jornada produziu, mesmo sem números consolidados de participação, imagens do descontentamento precoce com o Planalto num país que se acostumou desde 2013 a analisar manifestações como um termômetro político. Receberam de Bolsonaro, que está em viagem a Dallas, nos EUA, uma resposta que questionava a legitimidade do movimento e inflamava a polarização. “A maioria ali é militante. Se você perguntar a fórmula da água, não sabe, não sabe nada. São uns idiotas úteis que estão sendo usados como massa de manobra de uma minoria espertalhona que compõe o núcleo das universidades federais no Brasil”, disse o presidente.

A frase provocadora ecoaria nos cartazes que estudantes e professores levaram às ruas pelo país ao longo do dia. “H20, seu bocó”, exibia um estudante em Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Os cartazes, foram, de novo, um símbolo do dia, martelando a educação como um valor a ser defendido por todos, um totem ao qual é difícil se opor — assim como as palavras de ordem contra a corrupção foram na campanha do impeachment de Dilma Rousseff. As mensagens mais criativas disputaram atenção e compartilhamentos com outro símbolo da capilarização dos manifestações deste 15 de maio: em vez de apenas imagens das capitais, fez sucesso a procissão de guarda-chuvas do protesto na chuvosa Viçosa, um polo universitário no interior de Minas Gerais.

Não faltaram também imagens da multidão da avenida Paulista, local emblemático da força popular desde 2013 — embora com participação menor do que no impeachment. “É um absurdo o que o Bolsonaro diz, uma ofensa a nós que viemos às ruas. Ele quer acabar com o país e não tem respeito nenhum”, dizia a bibliotecária Vanessa Martins, que participava do protesto na capital paulista. Martins estudou na Universidade Federal de São Carlos e disse que estava na rua para apoiar estudantes que, assim como ela, só se formaram graças à universidade pública.

“Esta é nossa reação a uma tentativa de ataque à pesquisa”, dizia a estudante de Letras da Universidade de São Paulo Raquel Guets, enquanto segurava um cartaz com a frase “Lute como uma pesquisadora” e o nome do projeto que integra, afetado pelos cortes do Governo federal. Com 24 membros, a pesquisa Mulheres na América Portuguesa tenta reconstruir a história do Brasil por meio de cartas e outros textos escritos por mulheres que compõem diferentes acervos públicos. O projeto, que existe desde 2017, ganhou um edital da Capes, mas os 13.000 reais que garantiriam uma bolsista remunerada pelos próximos três anos foram bloqueados no contingenciamento do Governo. “Agora a gente está tentando algum financiamento internacional, porque não acreditamos mais em conseguir investimento do Brasil”, disse uma das coordenadoras do projeto.

Estudantes, professores, centrais sindicais, movimentos populares e outros apoiadores estiveram na Paulista, onde entoaram gritos de guerra não só em defesa de mais recursos da Educação, mas também contra a reforma da Previdência. Relembravam escândalos do entorno do presidente Jair Bolsonaro — como o Caso Fabrício Queiroz e o escândalo das candidaturas laranjas do PSL, partido do presidente — e pediam a demissão do ministro da Educação, Abraham Weintraub, que foi obrigado a passar a tarde respondendo a parlamentares na Câmara dos Deputados, num sintoma da desorganização política da base do Governo.

“Fui enganada. A vida toda (me disseram) que a educação não era pra mim porque sou preta e pobre. Vim mostrar que a universidade também é minha”, dizia a estudante de Letras da Unifesp Dayane Ferreira Reis, enquanto pintava o nome da instituição no rosto de um colega em frente ao Masp. Perto dela, a estudante do ensino médio Amanda de Souza, de 17 anos, segurava um cartaz: “Se você acha que a educação é cara, experimente a ignorância”. Ela diz estar com medo de perder a oportunidade de cursar uma universidade pública. “Estou estudando muito pra passar no vestibular e vim hoje porque estão querendo tirar uma chance que já é difícil”, afirma.

O ato na Avenida Paulista foi dividido em três blocos. O primeiro, com falas de lideranças das centrais sindicais. O segundo foi marcado por discursos de integrantes do movimento estudantil. Já o terceiro abria espaço para as falas de políticos. O petista Fernando Haddad discursou contra os cortes na Educação e convocou os manifestantes a não deixarem as ruas até que o presidente “devolva cada centavo” retirado da área. Derrotado por Bolsonaro nas últimas eleições, Haddad criticou o presidente. “Nós vamos educar Bolsonaro. É ele que precisa ser educado, e nós vamos dar essa lição a ele até ele aprender”, disse. Ironizou ainda a viagem aos EUA, “a nação que decidiu servir”.

No Rio, o ato também uniu sindicatos dos professores e estudantes, de secundaristas a universitários. “A luta unificou, é estudante junto com trabalhador!”, cantavam os manifestantes. “Somos sofressoras e não professoras. Esse estado nos maltrata. Recebemos um salário irrisório que não condiz com a nossa profissão. Trabalhei 51 anos em escola, como professora e supervisora”, reclamava Marina Gomide, de 80 anos.

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