“Cadê meu celular? Eu vou ligar pro 180. Vou entregar teu nome e explicar meu endereço, aqui você não entra mais”. Esse trecho da música Maria da Vila Matilde, da cantora e compositora Elza Soares, retrata a realidade de milhares de mulheres brasileiras que são violentadas em seus lares.
Dados da Rede de Observatórios da Segurança demonstram que, no Brasil, um caso de violência contra a mulher foi registrado a cada cinco horas e que, todos os dias, uma morre simplesmente pelo fato de ser mulher. O levantamento foi realizado com dados do ano de 2021 a partir de um monitoramento em cinco estados brasileiros: Bahia, Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo.
Se analisarmos os casos de violência contra a mulher somente no estado de São Paulo, houve um crescimento de 27% em comparação ao ano anterior. Foram, ao todo, 969 ocorrências em 2021, sendo: 157 feminicídios; 501 agressões físicas e tentativas de feminicídio e 97 estupros.
A imprensa SMetal procurou a delegada Veraly Ferraz, da Delegacia de Defesa da Mulher de Sorocaba (DDM), para solicitar dados locais e buscar orientações de como a mulher deve agir caso sofra algum tipo de violência. De acordo com ela, não há um levantamento que avalie quantas pessoas são violentadas por hora, mas assegura que a todo momento há mulheres procurando ajuda na delegacia especializada.
Somente em 2022, de janeiro a 15 de março, foram solicitadas 382 medidas protetivas na DDM, uma média de mais de cinco pedidos por dia. O procedimento trata-se de uma medida cautelar que é requerida para afastar o agressor do lar, proibindo-o de se aproximar da vítima. Em comparação ao mesmo período de 2021, houve um crescimento de 18,63%.
Como denunciar
A delegada ressalta que violência doméstica não se trata somente da agressão física e que qualquer tipo de abuso deve ser denunciado. “Se a mulher é ameaçada, xingada ou menosprezada, tem um relacionamento abusivo (físico ou psicológico) e, lógico, aquela que até mesmo apanha, ela é uma vítima de violência. E assim que ela sofre qualquer tipo de violência, deve procurar ajuda e acionar a nossa rede de apoio imediatamente”, assegura Veraly Ferraz.
Para fazer a denúncia, a vítima pode ir pessoalmente na Delegacia de Defesa da Mulher, com atendimento 24 horas, ou a qualquer plantão policial; pode ligar de forma anônima para o 180 ou ainda abrir um Boletim de Ocorrência Eletrônico. “O BO pela internet surgiu com a pandemia da Covid-19 e foi um avanço muito grande para mulheres que tem vergonha de ir pessoalmente denunciar. Além disso, é uma maneira mais ágil dela se manifestar, já que ela mesma pode fazer pelo celular”, explica.
Segundo Veraly Ferraz, entre os principais tipos de violência sofridas por mulheres em Sorocaba são: lesão corporal, ameaça e estupro de vulnerável. “Infelizmente, as vítimas estão ficando cada vez mais jovens e temos visto um crescimento de casos de estupro de menores de 14 anos.”, lamenta.
E completa: “entre os autores de violência doméstica, cerca de 95% está sob o efeito de álcool e drogas. Isso aumenta a falta de paciência no trato com o outro e qualquer coisa é motivo para partir pra cima da mulher”.
Fiz a denúncia e depois?
De acordo com a delegada, após a denúncia, a mulher será orientada conforme o crime que foi vítima e cada caso tem um procedimento a ser seguido. “Se há uma lesão corporal, por exemplo, na própria delegacia ela já é ouvida, faz a medida protetiva e o exame de corpo de delito e é aberto um inquérito policial. Vamos ouvir as testemunhas, se tiver, juntar os laudos, ouvir o autor e depois encaminhar à Vara da Violência para que isso vire um processo ou não, se houver provas suficientes para incriminar o autor”.
E continua: “se for caso de ameaça, é um outro procedimento. Vamos pedir a medida protetiva e eu só vou poder processar o autor se ela quiser. Se não, em seis meses o caso é arquivado e a medida protetiva também vale somente durante esse período. Nós vamos orientando na medida em que a vítima vem aqui e expõem o seu caso”.
Mas a delegada reforça que cada caso é um caso e depende de vários fatores. O importante é a mulher procurar ajuda. “Toda mulher deve se respeitar e respeito significa amor próprio. Só você vai saber o seu limite dentro de uma relação e, sabendo disso, jamais vai se rebaixar porque você é tão boa quanto a outra pessoa. Nunca deixe que a outra pessoa te rebaixe, te agrida. Se ame e se respeite e ninguém mais vai poder fazer nada contra você”.
Transfeminicídio
Veraly Ferraz lembra ainda que a violência doméstica é uma violência de gênero e abrange também mulheres transexuais. Segundo a Rede de Observatórios da Segurança, nos cinco estados monitorados, também houve crescimento nos casos de transfeminicídio. Ao todo, foram 27 mortes de mulheres trans, sendo o Ceará o estado com maior incidência, com 11 casos. Em São Paulo, foram registradas cinco mortes em 2021.
Procure ajuda
Qualquer mulher pode ser vítima de violência doméstica e se você se sente ameaçada, machucada, humilhada ou controlada, procure ajuda antes que seja tarde. Acesse aqui e saiba onde e como buscar apoio em Sorocaba.