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Entrevista

Marcia Tiburi: Lucidez pode salvar o projeto de país democrático

Para a filósofa e escritora Marcia Tiburi, "todos aqueles que negligenciam a internet nesse momento, precisam apurar sua perspectiva para acompanhar os novos tempos".

Imprensa SMetal
Foguinho/Arquivo SMetal

A filósofa e escritora Marcia Tiburi concede entrevista à imprensa do SMetal e aborda o destaque que as redes sociais tiveram nas campanhas eleitorais.

Autora de “Como conversar com um fascista – Reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro (2015)” e “Feminismos em comum” (2018), entre outros títulos, Marcia concorreu no primeiro turno à governadora do Rio de Janeiro pelo Partido dos Trabalhadores e também comenta sobre como foi essa experiência.

Imprensa SMetal: Marcia, você concorreu à governadora do Rio de Janeiro. Como foi a recepção de suas propostas nos locais que você visitou? Sentiu a população interessada na escuta ou sentiu algum tipo de preconceito por uma questão partidária ou por ser mulher feminista?

Marcia Tiburi: Foi uma experiência muito válida. Certo preconceito tanto pelo partido, quanto pela minha condição mulher, mas não entre os realmente mais pobres que tem profunda gratidão por Lula e pelo PT. As mulheres mais populares foram as mais empolgadas com a minha chegada. Muitas feministas preferiam votar em homens de seu partido, porque não quiseram ver que uma feminista poderia mudar o destino do estado. Na verdade, se dizem feministas, mas são submissas a seus partidos. Isso faz parte da história das mulheres e eu continuo disposta a mudar isso. O encontro com as pessoas que sofrem e esperam soluções da política nos dá a real dimensão do que importa em momentos de urgência.

Imprensa SMetal: Este ano, as redes sociais tiveram e têm um destaque nas campanhas. Visto que muitos dos candidato do PSL, por exemplo, apostam muito no virtual para conquistar eleitores. O próprio candidato à presidência desse partido não foi a nenhum debate na TV. Como você avalia essa campanha das redes sociais?

Marcia: A internet é um espaço aberto, uma “terra” nova que é preciso conhecer. Há empresas estrangeiras e nacionais se especializando nesse novo mundo. Uma nova política vai resultar de métodos e práticas que partidos e grupos tradicionais não dominam. Não se deve dizer que esse novo seja bom, como muita gente pode pensar, quer apenas dizer que é novo. A televisão morre aos poucos, e isso também é uma novidade que precisamos analisar para além do bem e do mal. Todos aqueles que negligenciam a internet nesse momento, precisam apurar sua perspectiva para acompanhar os novos tempos.

Imprensa SMetal: Você escreveu o livro “Como conversar com um fascista”. É mulher, feminista, filósofa, escritora e foi candidata a um cargo político. Como você avalia as declarações de voto ao candidato racista, homofóbico e que incita à violência por parte de mulheres?

Marcia: Esse é um fenômeno que venho denunciando há bastante tempo. Ele está chegando em seu ápice e precisa ser contornado. Não foi inventado hoje, mas foi turbinado pelos meios de comunicação de massa, televisão, jornais, rádios e teve nas redes sociais a sua maior difusão, mas não vem da internet. O mais complexo é explicar como aqueles que estão na posição de vítimas potenciais votam e defendem de modo apaixonado aquele ou aqueles que podem vir a destruí-los. Que devoção é essa? Eis o ponto que devemos compreender. O que será que alguém que corre o risco de perder tudo pensa que está ganhando?

Imprensa SMetal: Há na história algum fato que podemos comparar sobre esse aumento de propostas fascistas no Brasil?

Marcia: Sempre podemos trazer à memória os anos 40 na Alemanha e na Europa, mas também podemos pensar na história dos diversos genocídios que da Europa à Àfrica estão sendo plantados como possibilidades, porque é isso o que o candidato que prega a universalização dos armamentos está a propor. A destruição de uns pelos outros a partir do uso de armas. Um pesadelo para quem pensa e sente, mas um alívio para quem não pensa e não sente, para quem não se importa e está tomado por sentimentos de vingança, ódio, rancor e ressentimento.

Imprensa SMetal: Os movimentos sociais e os cidadãos conseguem combater esse discurso de ódio? Ou isso não é possível, sem a empatia?

Marcia: É claro que as pessoas podem mudar isso. Mas quem está tomado por esse tipo de prazer que leva a uma crença alucinada terá como escapar do que sente? O ódio dá uma compensação imediata às pessoas. Quem odeia se sente melhor do que seu objeto. Mesmo assim o ódio não é um afeto tão profundo, ele pode ser contornado. A inveja que está em sua base é profunda e não dá prazer. É por meio do ódio que a inveja se expressa. Mas o que é a inveja? A inveja é uma incapacidade para o desejo, por isso, o invejoso é também sempre meio burro. Por que o desejo se expressa em Inteligência, criatividade e curiosidade.

Imprensa SMetal: Fique à vontade para tecer comentários sobre algo que não tenha perguntando.

Marcia: Nesse momento, precisamos nos dedicar à luta pela democracia, pelo esclarecimento, pela lucidez. Eu espero que os cidadãos lúcidos de nosso país estejam atentos e votem com responsabilidade. A partir daí podemos retormar o nosso projeto de país democrático.

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